MAMÃE,FLOR DE SERRA NEGRA

Hoje nesta manhã, o sol entrando varanda a dentro, os Bem-te-vis a entoar o canto pelos galhos das arvores que nos rodeiam, me levam a Serra Negra, cidade do sertão do vizinho, Rio Grande do Norte que, com algumas passadas a mais, entra na Paraiba, passando por Caicó, se chega a cidade de São Bento. E anos depois, eu, vejo aquela jovem mulher, logo cedo, fazendo sua tourné, na cozinha, passando pela sala de jantar, adentrando aos nossos quartos, fiscalizando nossas fardas do Colegio das Lourdinas, nossas bolsas, lancheiras, olha o relógio e, nos embarca, no Ford 51 de papai...as sete horas da manhã em direção ao Colégio das Lourdinas, onde papai, ao ir para o trabalho, todos os dias, adentrava ao portão e, nos deixava entre os muros e o belo Jardim do Colégio de Nossa Senhora de Lourdes, ali bem no inicio da Av. Presidente Espitacio Pessoa Tinha, eu então dez anos, mamãe, nossa rainha, bela e doce Flor de Serra Negra tinha apenas, 30 anos e, ela é, a minha mãe, nascida na Fazenda Conceição, em dois de fevereiro de 1921, mais jovem, que papai, apenas tres anos...

Hoje, pela manhã, continuando a rever velhos e antigos retratos, a encontro, bela, esbelta, alta e sorridente, em meio ao jardim da nossa casa, caminhado entre canteiros, em forma de pequenas figuras geométricas, em cimento, pelo chão desenhadas. Um canteiro em forma de triangulo, muitas rosas brancas, amarelas e vermelhas... margaridas, beneditas, cravos, ortencias, e Risos de Maria que entre os triangulos e circulos floreciam. Um gramado singelo. os separavam milimetricamente. Este, um dos retratos de mamãe, que agora tenho, diante dos meus olhos... marejados de saudade...

Mas, as lembranças avançam na ordem das fotos que casualmente passam pelas minhas mãos e, nos vemos, em pleno Parque de Diversão, na Festa das Neves, sentados no Banco de um Carrocel... e por ai vamos... Depois, sem atinar para a ordem cronologica do tempo que passou, nos vemos, já no famoso e tradicional São Pedro, do antigo e hoje, inexistente "Clube Astréa" só, o Prédio permanece ali, entre o casario antigo de Tambía...

E, nas minhas mãos ansiosas, outra foto, me carrega pela ladeira da Igreja do Miramar. Adentro ao Clube Cabo Branco, quando Presidente, era o querido e saudoso amigo de papai, Dr. Fernando Paulo Carrilho Milanês. Em uma noite de Carnaval de 1966, precisamente, 19 de fevereiro, ano que, inicio o Curso Direito, ali naquele belo Prédio, da antiga Faculdade de Direito da UFPB, na Praça João Pessoa... Logo pela manhã, a movimentação, lá em casa, começa.Mamãe, minhas irmães, todas a cuidar, dos trajes da primeira noite de Carnaval, daquele, hoje, longinquo sábado de Carnaval de 1966... È, quando, mamãe, esperta como ela só, percebe, em mim, uma das mais animadas, e "põe água fria na fervura", quando diz, que não preciso me preocupar "com que roupa eu vou", porque, tenho que cumprir a promessa que ela fez, com Nossa Senhora do Carmo... quase caio, quando mamãe disse, - " Minha filha, eu fiz uma promessa, se voce passasse no Vestibular de Direito, não brincava o carnaval deste ano " .....

Pelo amor de Deus, precisa dizer o tamanho do choque....nunca lembro se chorei, se gritei, se fiquei muda, se me tranquei no quarto, se desmaiei... mas, me lembro perfeitamente, que na hora do almoço, ainda chorando, desconsoladamente, não fui para a mesa... não tinha fome, não queria almoçar... dai a pouco, entram no quarto, mamãe e papai... O que, me lembro e não esqueço jamais, foi a proposta de papai, -" Sua mãe e eu, já conversamos sobre isto, há pouquinho e, que tal, Nossa Senhora, como a Santa Mãe de Jesus, aceitar a troca de um, por cinco... "

Eu, vi uma "luzinha brilhando no fim do tunel" e, uma esperança querendo invadir, todos os meus sentidos ... não entendi e perguntei... " Papai, com é isso..." E, entre meio perdida e assustada, ouvi. " Muito simples, voce vai para o Cabo Branco, hoje, brinca o Carnaval completinho... mas, vai passar, até sua formatura, sem Carnaval". Inopinadamente, aceitei a troca da promessa, e, nem sequer pensei, no que seriam cinco anos, sem Carnaval...

Depois, de tudo, no meu aniversario no mes de outubro, mamãe voltou ao assunto... e, disse-me, o quanto foi difícil, aceitar a proposta de papai, mas, por amor e pena de sua primogenita, se rendeu ao que, papai lhe propusera. Foi até seu quarto e, lá, diante do seu Oratório, com muita tristeza, rezou, rezou muito e, encorajada, pela minha tristeza e lagrimas, encontrou coragem e, de mãe para mãe...a Euzinha foi ao Sábado de Carnaval, 1966 do Cabo Branco. E, para honrar o compromisso de mamãe, com minha Santa Nossa Senhora do Carmo... em mim, parece que se quebrou o encanto, e a ilusão do Carnaval.... e, paguei a promessa de mamãe por longos anos... sem problema, sem Carnaval, nem sentir falta...

Josenete Dantas
Enviado por Josenete Dantas em 06/12/2014
Reeditado em 18/09/2016
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