OS SEGREDOS DAS BOLSAS FEMININAS... (EC)

Sentou-se ao meu lado no trem olhando o celular. Repentinamente, abriu a mochila e remexeu. A princípio, com aparente tranquilidade. Mexe que remexe. No rosto surgiram traços de ansiedade. Jamais saberei o que procurava. Ela não tirou nada de dentro, Seu rosto transformou-se novamente com aquele arzinho de “Ufa! Encontrei...” Teria encontrado o quê? Fiquei quase incontrolável. Retornou ao celular. Digitava e sorria entre um e outro rápido intervalo ao digitar e ler. Pareceu ter lançado um olhar de soslaio em minha direção e percebendo minha curiosidade teve uma atitude tipo assim: “Vou me divertir um pouco”. As mulheres são perversas. Passou a remexer distraidamente a mochila. Não aguentei! Para não ter uma síncope, desci duas estações antes de meu destino e apanhei o trem seguinte.

Com a minúscula bolsinha rosa carregada a tiracolo, a menininha tinha a felicidade estampada no rosto. Mostrava para a mãe cada objeto que retirava e recolocava dentro. Mostrou um anelzinho, um espelhinho, uma massinha escolar que fantasiou fosse batom. A mãe, pacientemente, dava-lhe a necessária atenção. Minha curiosidade do que mais sairia dali foi interrompida pela ordem da mãe: “Guarde tudo... vamos descer!” Ainda segui com os olhos até sumisse na escada rolante e o trem fechasse as portas. A garotinha até me fez um tchauzinho.

Era preciso identificar-se para entrar no prédio. Estava um pouco atrasado. Apenas uma pessoa atendendo e liberando os crachás. Na minha frente, uma senhora vasculhava, retirava e colocava objetos sobre o balcão, entre sorrisinhos desculposos. Nem reparando em minha aflição pelo atraso, depositou uma carteirinha com moedas, o bilhete do Idoso, um tercinho. Quando apareceu o cartãozinho com a imagem de Santo Expedito, quase dei três pulinhos, pedindo para São Longuinho que ela encontrasse logo a carteira de Identidade. Subitamente, ela travou. Meio sem graça, olhou para a atendente e perguntou: “Precisa mesmo? Eu sei o número”. Conformada, vendo a fila aumentar e ante a realidade da senhorinha não representar qualquer risco para a segurança, ela forneceu o crachá e liberou a catraca. Não demorou muito para recolocar tudo dentro da bolsa. Chegada minha vez, procurei meu documento na carteira. Será que o havia esquecido? Num átimo, lembrei-me... Já o havia retirado e colocado no bolso da camisa... Custou-me a perda de um elevador.

Na sala de espera, as duas conversavam ao celular. “Espere um minutinho”, disse uma delas. Abriu a chique bolsa preta “falsiê ching-ling twenty five” e mexe que remexe... Para minha aflição, sem nada retirar. Retomou a ligação: “Não está aqui... Acho que deixei na vermelha... Nem pense em mexer nela...”. Justamente a cor da outra que também era aberta. As mulheres são mesmo surpreendentes. Rapidamente, entregou o cartão do convênio e a Carteira de Habilitação à secretária.

Um casal chegou e o homem pediu à mulher que guardasse a chave do carro. Ela prendeu a chave na alça, aproveitando para retirar um livro. Pelo título, devia ser de autoajuda: “Organize-se e viva melhor”. Acho que comprarei um...

A moça saiu do consultório e despediu-se do médico. Trajava uma roupa, que em meu desconhecimento em moda, diria fosse um vestido indiano. Combinava com o rústico apetrecho de pano cru carregado despojadamente cruzado à frente do corpo. Parou frente a porta do hall, esticou-se ao fundo do apetrecho e tirou uma tiara e colar, ajeitados tranquilamente. Novo alongamento e dois brincos foram também colocados.

A demora no atendimento fez-me refletir como a pressa nos faz mal e devemos contemplar mais a vida, satisfazer os desejos da descoberta de novos horizontes para entender melhor as pessoas. Por exemplo, poderia dominar a ansiedade e não descer do trem antes da moça que fingia procurar algo. De outra parte, por que não descer na mesma estação e seguir a menininha e sua mãe. Desnecessária a agitação a apressar a busca paciente da senhorinha.

Vivendo e aprendendo...

Prometi tornar-me uma pessoa melhor.

A volta para casa consegui controlar a curiosidade ante o desafio de outras tantas mulheres, que vi passarem, revirando a “Cartola de Mágico”, apelidadas de bolsas femininas a denunciar personalidades ou estado de espírito.

Sentindo-me vitorioso, por não me desviar a mais nenhuma, abri a porta da sala.

Meu coração disparou...

A vida é cruel... Não perdoa...

Estávamos com visitas...

No mancebo, candidamente olhavam para mim, algumas dependuradas.

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Este texto faz parte do Exercício Criativo - Bolsa de Mulher

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Pedro Galuchi
Enviado por Pedro Galuchi em 17/11/2014
Reeditado em 29/11/2014
Código do texto: T5038262
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