O Homem na calçada

Lá estava ele sentado na calçada, desolado da vida, com roupas rasgadas, sem tomar banho e sem saber quem era. Há dias que estava vagando, ora nas ruas, ora voltava para aquela calçada, pois ali passavam muitas pessoas e ele se distraía, rindo-se, ao vê-las de um lado para outro.

Quase todas olhavam para o celular enquanto caminhavam. Se comportavam de maneira semelhante, estivessem de paletó e gravata ou de chinelos de dedo.

Ele nunca foi notado ali sentado, mas isso não causava desgosto algum, visto que observando aos outros, ninguém se notava mesmo. Sentia um pesar, as vezes, por não ver sentido em viver desse jeito. Lembrava dos versos de Cora Coralina: “Nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas”!

Seria impossível tocar o coração de alguém? Se esbarravam naquela calçada, o tempo todo e, nem se olhavam, nem se desculpavam pela força do atrito entre seus braços e movidos pela urgência de chegar, cada qual em seu lugar.

Uma mulher puxava a filha pelo pequeno e fino braço, enquanto falava ao celular, seguindo pelo lado direito. Um homem, que também falava ao celular, arrastava o filho franzino grudado em sua mão, seguindo pelo lado esquerdo, em direção contrária à mulher. De repente o tempo parou.

O homem levantou-se da calçada e, admirado com o que via, observava a cena. A menina e o menino se chocaram um no outro, de forma que se enroscaram, os pais derrubaram os celulares no chão. Os quatro pararam de andar e se olharam. Os adultos perguntaram se seus filhos estavam bem. As duas crianças riram muito e se desculparam.

A mãe com a menina continuou seu caminho, assim como o pai com o garotinho, mas agora, eles conversavam com os filhos sobre o acontecido. A pressa deles continuava apesar de o ocorrido ter durado alguns segundos.

Pedro Joaquim de Souza, com brilho nos olhos, pegou seu pedaço de coberta, enrolou e escolheu uma direção para ir adiante. Ainda existia esperança e, os sorrisos daquelas crianças o fizeram acreditar que nem tudo estava perdido. Viver ainda vale a pena.

Michele Valverde
Enviado por Michele Valverde em 09/09/2014
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