A bicicleta

A BICICLETA

Sempre tive uma relação de pai e amigo com os meus filhos. sempre conversamos sobre tudo, e sobre todos.

Problemas resolvíamos em conjunto, com opiniões e atitudes.

A semana passada, conversava com meu filho Daniel, o mais moço.

Um chope, dois chopes, e ele começou a falar da sua infância.

Relembramos muitos acontecimentos.

De repente, ele olha em meus olhos, e diz em tom de voz baixa.

--- pai, o senhor nunca me ensinou a andar de bicicleta.

Daniel, hoje é médico, trabalha em uma grande empresa.

Sorri.

--- eu tentei filho, mas você tinha trauma dos dois acidentes com seus irmãos mais velhos.

--- eu sei pai... primeiro foi o André, caiu e quebrou os dentes da frente, depois de uma semana o Adriano, também caiu e quebrou os dentes da frente. FALTA EU. - abriu um enorme sorriso.

--- pois então... depois que você quase caiu, e a Tatiana tomou a sua bicicleta, você desistiu prematuramente de ser um ciclista, mas.... eu comprei uma para pedalar, quem sabe eu te ensine depois de velho.

Ele riu. Eu ri, tomamos mais uma rodada de chopp, e a conversa parou por ai.

Ha uns dias passado eu comprei uma bicicleta usada e deixei na casa do André, a noite, fui até lá, peguei a Caloi, e fui bater na casa do Daniel, acho que era mais ou menos 21 h.

Ele abriu a porta com os olhos cansados, tinha trabalhado puxado durante todo o dia.

--- aconteceu alguma coisa pai? - indagou um tanto assustado.

--- não filho... vim lhe trazer uma bicicleta, vou te ensinar a andar.

Ele esfregou os olhos não acreditando no que eu acabara de afirmar.

Fui até a caçamba do carro e retirei o veículo de duas rodas.

Ele prontamente foi me ajudar.

--- não é nova...mas é boa. - disse.

--- parece resistente pai.

--- isso eu sei que é... preciso ir, domingo eu venho para andarmos de bicicleta e você tirar esse trauma ciclístico da sua mente. - sai dando risada, e ele colocando a Caloi para dentro de sua casa.

DOMINGO.

Era mais ou menos 15 h, quando eu aportei na caso do filho traumatizado. rrssrrs.

Apertei a campainha, e ele logo apareceu de tênis, bermuda, e camiseta. empurrava a bicicleta.

--- pronto pai.... estou apto para o aprendizado, mas o pneu esta muxo.

--- engraçado... quando eu a deixei estava perfeito.

--- esvaziou sozinho pai.

olhei meio desconfiado. Estaria o menino com medo?

--- tudo bem, coloque sua cabrita na caçamba e vamos até um posto encher o pneu.

--- não quer deixar para outro dia pai.

--- não... é hoje ou nunca.

Colocamos a bicicleta e fomos até o posto, antes ligamos para o Andre, que se diz exímio pedalante para confirmar o valor para calibrar o pneu.

Voltamos. Tudo pronto, para a nossa jornada.

--- pai... antes acho melhor eu tentar dar uma volta aqui em casa.

--- tudo bem. então pega uma latinha de cerveja para mim.

Ele foi correndo até a geladeira, trouxe uma Skol gelada.

Pegou a bicicleta, sentou, testou os freios, e começou a circular a piscina.

Eu mais que depressa, peguei o celular, e deixei a câmera armada, vai que o menino caísse dentro da piscina, seria uma foto histórica, e o facebook o meio de comunicação ideal para aquele evento inesperado.

Porém, ele se comportou bem, não caiu. Desliguei a câmara com tristeza. rrrsss.

--- pronto pai, vamos lá, a avenida é a nossa meta.

Pedalamos. No inicio ele encontrou alguma dificuldade, ficava com medo dos carros, parava, encostava no meio fio.

Começou a reclamação.

--- pai... a bicicleta esta dura, eu tenho que fazer força para pedalar a sua parece diferente.

--- a minha é nova filho, além do mais tem que ter pratica, você esta indo bem, vamos, não podemos parar.

--- pai... tá difícil, acho que o pneu esta esvaziando.

Paramos.

--- deixe me ver... humm, façamos os seguinte, vá na minha, e eu vou na sua.

A troca foi espontânea.

Assim como um super herói montado em seu veículo voador, ele tomou posse da minha bicicleta nova, e saiu pedalando afoitamente, sem ao menos olhar para trás, sem fazer ziguezagues, em um ritmo perfeito, como se fosse um ciclista veterano.

O pneu da bicicleta que tinha ficado comigo, estava mesmo muxo, completamente muxo e eu tive que ir empurrando.

Cheguei na casa de Daniel quase sem folego.

Ele veio ao meu encontro. sorrindo. feliz com sua aventura, como um garoto de 8 anos, que consegue algo impossível.

--- pai.... pai eu sei andar de bicicleta, putz, é muito bom.

--- claro que sabe filho.

--- venha.... vamos comemorar, vamos tomar uma cerveja, uma não várias, vou ligar para o André, para a Taty, para o Adriano. - disse ele com um sorriso que fazia inveja.

Sua alegria era contagiante.

Voltou com a cerveja e sentou-se ao meu lado.

Tomamos meia lata em um só gole, estávamos suados.

--- pai... agora eu posso contar-lhe uma coisa.

--- conte filho.

--- muitas vezes eu sonhei que estava andando de bicicleta, como se pedalasse entre nuvens, uma sensação maravilhosa, sempre acordava, após uma queda, agora não pai, agora eu sei andar de bicicleta.

--- acho que você sempre soube filho, talvez eu que não tenha lhe dado a devida atenção, foi uma época difícil, sua infância transcorreu junto com a minha faculdade, a separação, enfim uma séria de acontecimentos, que infelizmente agora estamos conseguindo recuperar. posso falar de boca cheia, você me surpreendeu. Você é um magnifico ciclista.

--- vou buscar mais uma pai, estou muito feliz, acho que feliz por demais.

UMA CRIANÇA.... UM ADULTO.... UM MÉDICO.

Parabéns filho. Você já sabe andar de bicicleta.

Ton Bralca
Enviado por Ton Bralca em 06/08/2014
Reeditado em 05/11/2016
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