A MANDIOCA MUITO ESTRANHA

- Que merda é esta? Você quer matar a tribo toda?

O elemento, de que será alvo a minha crônica, é nada mais, nada menos que a apetitosa raiz tuberosa comestível.

A índia velha vivia, como qualquer outra, na tribo envolvida em suas atividades normais. Um dia casou, e levou seu amado para longe da tribo. Trocou a floresta verde com todos seus mananciais de águas cristalinas e o voar de lindos passarinhos, pela floresta em concreto armado de águas turvas e fedorentas, e de passarinhos engaiolados.

Na floresta de pedra e concreto nada se planta, nada se arranca da terra, tudo é retirado da entranha dos prédios. A terra, já desnuda das árvores e matos rasteiros, é revestida de um manto preto chamado asfalto. A casca das árvores e frutas foi substituída por latas ou plásticos.

Na floresta de pedra tudo é diferente da floresta verde. A floresta de cimento aprisiona e maltrata os costumes e conhecimentos da floresta verde tornando-os inúteis e incompreensíveis.

O tempo é cruel, e a índia velha foi se desvestindo de sua cultura indígena e se vestindo desta roupagem maldita da cidade.

Um dia, a índia velha foi acometida de uma saudade enorme das coisas de sua tribo. Viu a reportagem de um povo primitivo colhendo mandioca e quebrando suas ramas. No final da reportagem muita gente se deliciando com pedaços do tubérculo.

Ela se encantou, lágrimas brotaram de seus olhos, e teve uma ideia.

- Vou fazer o mesmo para a minha tribo!

Pegou seu amado índio, companheiro das solidões da imensa floresta de pedra, e foram visitar seus amigos, e parentes saudáveis na tribo distante lá na floresta verde.

- Tenho uma surpresa para vocês! Hoje a gororoba quem faz sou eu. Falou toda animada e saudosa a índia Velha para a tribo reunida.

Um pouco desnorteada, e um tanto fora dos costumes da tribo, olhou de um canto ao outro e perguntou.

- Onde tem um pé de mandioca por aqui?

A índia se perdeu no imenso quintal como se dissipa a mente em mil pensamentos. Colheu o que precisava, e se acomodou no fundo da oca. Tudo estava ardendo na panela de ferro pendurada na trempe.

O fogo lambia o fundo da panela enquanto a fumaça ordinária, correndo de um lado ao outro, tentava escapulir de dentro da oca.

A índia velha queria fazer uma grande surpresa para a índia maior, mãe de seu amado.

E fez.

Os índios de cócoras, em volta da trempe, ao iniciar a comilança começaram a rir.

A índia mãe do amado da índia velha ao tentar experimentar a macaxeira, puta da vida, pergunta:

- Que merda é esta? Você quer matar a tribo toda?

A índia velha saiu desenxabida, macambuzia de dentro da oca, e seu amado foi logo em seguir e disse amorosamente.

- Meu amor, eu pensei que você soubesse cozinhar mandioca! Ou melhor, eu pensei que você soubesse o que é mandioca!

- O que é que eu fiz de errado?

- Você, ao invés de cozinhar a raiz cozinhou as ramas!

A índia mãe só deixou seu filho voltar para a selva de pedra depois que a índia velha fez na tribo um curso completo de botânica.

Mario dos Santos Lima
Enviado por Mario dos Santos Lima em 01/05/2014
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