Uma incognita mulher

Hoje, nesta Sexta-Feira Santa, para o Retiro, ela escolhe um convento nas imediações de uma pequena cidade, onde tem, marcado um encontro consigo mesma.Esta mulher é ela. Ela, é o seu próprio psicanalista, psiquiatra e psicólogo e, se encontra agora no pátio de convento, rodeado de antigas Mangueiras que, a grosso modo, parecem que nem frutos, oferecem mais. O belo jardim, um gramado bem cuidado, canteiros, muitas flores e rosas de várias cores. Em meio a tudo isto, canto de pássaros em harmonia, entoam uma bela sinfonia.O barulho de uma pequena cachoeira de águas claras vai escorrendo pelo estreito riacho que, se esgueirando vai sobre pequenas pedras.E como se não prestassem aos encantos deste pequeno universo, vamos encontrá-la em meio a tanta beleza, em uma espreguiçadeira relaxadamente acomodada, olhando para dentro dela, introspectiva, parecendo alheia, a toda esta linda e harmoniosa paisagem que arrodeia.

E ali, aos setenta anos, olha com rigor para dentro de si, logo ela, que generosa, era com erros, vícios e defeitos dos outros, até mais, do que devia, ...E agora, é como se fora ao mesmo tempo Ré, Juíza, Promotora de Justiça e Advogada de Defesa, dela própria, se entregando a este julgamento, questionando-se frente a frente consigo mesma.A hora é chegada...O momento do acerto de contas com ela propria, por muito e muito tempo adiado, ali estava, ela é, a protagonista da estória, por ela, exposta, narrada, encenada, interpretada, saindo de dentro para fora dela mesma e, assim determinada, presta interrogatório, interpelando-se, disposta a responder todas as perguntas e nada omitir, não importam os questionamentos por ela a ela feitos e, espontaneamente, com a coragem de sempre, nua de coração e alma diz:

1.Quando jovem, era uma guerreira: capaz de enfrentar o mundo,suas dificuldades, transpor barreiras,vencer obstáculos,lutar com garra, sem me deixar abater. E a fagulha de orgulho, que se apresentava, com o nariz um pouco arrebitado e a cabeça levemente erguida, mas, mesmo assim, ainda resta, uma pitada de humildade, sim, para amaciar um pouco as durezas da vida que, capazes, não foram de me fazer desistir dos meus sonhos, nem minaram, os alicerces dos meus ideais, até agora, por incrível que pareça, o saldo, é positivo.

2.Ao mesmo tempo, sou uma simples mulher: sonhadora, romantica no desejo de amar e ser amada, mas o amor que sonhei para mim, mesmo em confronto com a realidade, eu queria para minha vida, aquele amor que tivesse, o destino dos eternos. Este, o amor por mim sonhado, mesmo que para muitos, seja apenas, uma utopia... mas, assim mesmo, corri atrás obstinadamente e, quem sabe, o encontraria...Da natureza, sou uma amante declarada, encantada com o mar, em uma noite de lua, deixo -me quedar-me diante de um céu azul-marinho escuro, rebordado de estrelas brilhantes e luzentes, e me rendo, extasiada diante de um " Por de Sol' lindo, que se espreguiçando sobre as serras, vai deixando seus raios luminosos de cores incríveis, em um céu de nuvens tomadas pela mais estonteante, policronia de cores. Sra. Dra. Juiza, eu sou apenas, uma mulher do meu tempo...

3.Devo, acrescentar: ciosa das minhas opiniões, defendo com ardor algumas teorias, com muita paixão,defenso as minhas teses, mas mantenho respeito e admiração, por quem me contradita, porém, terá que dispender, um relativo esforço para confrontar minhas ideais, teorias, teses e ideias, entretanto, por fidelidade aos meus princípios, confesso, me curvo aos argumentos convincentes e reconheço que não sou dona da verdade e, com honra e dignidade sem precisar ajoelhar-me, com elegância, ética, superioridade de espirito, sei reconhecer que a estrada, e o roteiro que tracei, acaba, ali, sem vencidos nem vencedores e, que devemos, louvar tão somente, ao objetivo a que nos propusemos a empreender e alcançar, ou seja, o resultado do salutar embate.

4.Tenho e sinto um grande amor pelos nossos iguais, me comove e, ao mesmo tempo me constrange, a miséria, tanto material, quanto espiritual e moral do ser humano. E muito mais, me arrata para baixo, a dor que venha a ferir, magoar alguém próximo de mim, sou de sangrar minhas próprias mãos, coração e alma, para diminuir o sofrer dos que amo, com doação, devoção e total entrega. Por outro lado, confesso, que estupida e egoisticamente, exijo o mesmo peso, volume, quantidade, qualidade e reciprocidade, na entrega, na doação, repetindo agora, como já disse, alguém: "Eu deixaria, Maria Antonieta, envergonhada"

5. Mas, que fazer... sou apenas uma mulher inserida na complexidade do ser humano, nesta dualidade simbiótica de corpo e alma. Além de tudo, sou afeita a pedir desculpas...E, o faço, na maior tranquilidade e sem pejo, talvez eu seja assim, porque portadora sou, de temperamento impulsivo, explosivo, dizendo, muitas vezes o que nunca pensei, falar...E após, a explosão, saio pisando forte, ergo a cabeça, bato a porta... Entretanto, quando do batente passo, só Deus, para me socorrer e aliviar o peso e a dor do arrependimento. Mas, a ponta de orgulho aparece tão aguda, que me deixa silente, pesarosa e triste, envergonhada, encolhida pelos cantos da vida, no entanto, a ninguém deixo percebe o meu sofrer... O riso na face desenhado, olhar firme, o meu sofrer, aparentemente passa ao largo. Porém, dentro de mim, se instala um terrível desconforto comigo mesma, em razão da falta dos abraços que meus braços não alcançam mais. Pelo tamanho e medida do meu coração, quero comandar minha alma, esquecendo que ela é, simplesmente, eterna. E, em assim sendo, ela nem nasce, nem morre, simplesmente existirá, sempre... Meu entusiamo pela vida, é maior que a minha energia, uma vez que, sou de me dá, esqueço das minhas limitações e, o mais grave, tenho o mau costume de aceitar incumbências além do que dou conta, em resumo, tenho imensa dificuldade em dizer, não, quando se trata de coisas materiais e, em especial, aqueles fazem aflorara, minha emoção E isto, Senhora Juiza, Douta Promotora e Justiça e Nobre Advogada de Defesa, me desmonta... E, se inicia a minha " Via Cruz"... passo então, a catar dentro de mim forças para juntar os cacos, estilhaços e, os estragos que provoco dentro de mim...

6 Mas, vou continuar a me olhar pelo o avesso! Preciso continuar este mergulho que faço para dentro de mim mesma. E digo, com toda a convicção: tenho um defeito horroroso, um segredo que guardo a sete chaves, embora, talvez, os mais intimos, creiam, que sou uma pessoa humildade, mas, qual o quê...sou uma orgulhosa, nunca assumida, sou critica, as vezes intolerante, sabendo esconder, talvez, por instinto de defesa, aquela doçura e benevolência que pode surgir de repente como se fora, em um passe de mágica.

7.Minha nobre Advogada, sinto muito, não sei o que fará para minorar a minha pena... e, ainda tem mais, acho que, por puro egoismo ou covardia, muito demorei, admitir:Eu sou covarde, sim... vejam bem, se alguém se magoar comigo, e, simplesmente se afasta, sem, possivelmente querer me dispensar qualquer explicação, simplesmente foge, some, se cala, desaparece mas, não me diz frente a frente, os motivos daquela distancia e ausência imensuráveis. A Euzinha, corre atrás: telefona, manda flores, cartão pedindo desculpas e suplicando paz... tudo, em nome da esperança que mora comigo e, ter a certeza de que, em um próximo ou longo amanhã, dizer a mim mesma:Todas as chances lhes foram dadas, para voltarmos ao antes... mas, esgotada todas as oportunidades de esclarecer, manter entendimentos, desculpas, escusas e perdões, explicações e reconciliações, agora acabou... estas pessoas ou pessoa, definitivamente, estão sepultadas e, sem quaisquer outra oportunidade de explicação e ou reconciliação, entretanto, meu coração, o ódio, não tem guarida nem abrigo, sequer, o conheço... mas, tem um pequeno detalhe, até perdoo, porem é um segredo que guardo a sete chaves, inclusive, esqueço os entreveros, passo até lembrar, de vez em quando as coisas boas, instantes felizes e ou momentos mágicos, estes, a gente não varre assim... tão fácil... mas, como por mim foram dadas todas as oportunidades.. assim, da minha parte...acabou... não há mais nada, só as boas lembranças. O computador, no cérebro instalado regista, imprime, e tira retrato e, diante de uma realidade inconstestável, meu coração cede, inexoravemtne, a razão...

Estes, são os meus vícios, defeitos e pecados. E, aqui, estou eu, me julgando, na solidão de mim mesma, preciso por mim, mesma ser absolvida. Pois, não sou vitima, muito menos autora e, definitivamente, sou, quem sabe, apenas mais uma, incognita, mulher!

Josenete Dantas
Enviado por Josenete Dantas em 18/04/2014
Reeditado em 31/12/2014
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