O CIRCO

Há quase dois mil anos o imperador romano Tito inaugurou o Coliseu, promovendo jogos que duraram cerca de cem dias, durante os quais morreram centenas de gladiadores e milhares de animais. Era o auge da política do “pão e circo”. A partir de junho próximo, o Brasil vai contar com 12 coliseus, espalhados de norte a sul, palco de jogos que se estenderão por um mês.

Mas hoje os gladiadores são diferentes, não se engalfinham até a morte e nem os animais participam do ritual intramuros. Hoje, a carnificina acontece do lado de fora. Os animais estão soltos e, armados de pau, pedra e barras de ferro, trucidam sem piedade o semelhante que tem a pele do time adversário. Uma camisa errada, na hora errada, é sentença de morte por espancamento. O último massacre foi de um torcedor santista. Quem será o próximo? Homem, lobo do outro homem.

E aí eu pergunto: Dois mil anos de civilização só serviram para alterar o lugar onde jorra o sangue? Antes, dentro e, agora, fora dos estádios? Progredimos muito pouco. Mesmo nas arquibancadas, às vezes a magia do espetáculo fica comprometida com urros ancestrais que estigmatizam o gladiador em função da armadura que a natureza lhe deu, como aconteceu outro dia no Peru.

Cor da pele ou cor da camisa, o certo é que, em pleno século XXI, o homem das cavernas ainda ruge no peito de muita gente. No futebol, no trânsito, na rua – para roubar ou não -, qualquer hora pode surgir das sombras um bando de primatas, empunhando suas clavas e despejando em cima das vítimas milênios de barbárie acumulada. Isso explica, pelo menos em parte, por que vem aumentando o índice de criminalidade no país. Na contramão, faltam vagas no sistema prisional. Os condenados do andar de baixo são amontoados em celas precárias, onde se espremem como os passageiros do metrô na hora do rush. Aí, com superpopulação, as rebeliões estouram. E as Pedrinhas ricocheteiam no gabinete dos governantes.

Daí a minha sugestão de que, cessado o hipnotismo coletivo da Copa do Mundo, a maioria desses estádios (destinada a se transformar em elefante branco ou monumento ao desperdício) seja convertida em presídios, dando-se-lhe, portanto, uma finalidade permanente, a justificar os milhões de reais que foram sugados em sua construção.

Lembremo-nos de que o Coliseu romano não resistiu à ação do tempo e dos predadores, dele só restando hoje a estrutura básica, que nem de perto evoca seu esplendor original e a glória dos césares.

Nós teremos 12 coliseus. Número suficiente para oferecer circo e um pouco de ordem e progresso ao povo. E aí, com mais feras domesticadas ou atrás das grades, quem sabe teremos tranquilidade para amanhar o pão com o suor do nosso rosto...

Pereirinha
Enviado por Pereirinha em 25/02/2014
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