A primeira vez de Cristiana


 entrega.Aqui é importante registrar que não me reporto a quem diz que jamais praticaria o naturismo, ou a quem, mesmo sendo o maior furão de fila no açougue mas que cruza os dedos, se benze, além de torcer o nariz e cuspir no chão para a prática em questão – mesmo sabedor que sou que há nuelos e nuelas que até pisar na areia operava como animador/a de torcida dessa gente. Não. Aqui a jovem Cristiana me faz reportar aos calejados. Que assim mesmo teimam em pisar em cima do que os podem identificar, a descontração, a

Cristiana, que, contudo, não falou muito com todos, mas as sacadas que tivera nas vezes que conversara conosco, entre estes um casal de amigos também naturistas de primeira viagem, e que me levou a vê-la como uma garota especial, é bem jovem, como já disse. Mas isto não a impediu que concluísse, como concluiu, ao me responder, de pronto, na lata, com a palavra Livre, à pergunta de como ela se sentia sendo a sua primeira vez. O que deve soar para muita gente como à um refrigério, a um descarrego dum fardo das costas, como a um indutor de decisão. Isto aos que ainda, mesmo que caindo os dentes no naturismo, insistem uns na camisa outros na canga. - E não troque por carapuça e depois ponha a culpa em mim. Por favor.

Lá, onde antes de tudo o que se busca é a armonia entre, corpo, mente, e natureza, todos vêem tembém seu corpo com todo o cacau do mundo que você pensa que tem; com o peito mole mais que o da velha que vende milho assado na esquina de casa; assim como vê seu pinto pequeno, ou majestoso; a sua perereca escondida, ou exibida, dependendo do seu ponto-de-vista. Mas ninguém se importa com o pequeno, com o majestoso, com a escondida, ou com a exibida; se importa antes com o seu conteúdo, seja ele por formação acadêmica ou empírica. Seja por uma singela experiência de vida que queira contar, ou pela humildade de querer ouvir quem a viveu mais intensamente e que repassa com satisfação. O que importa é o que você reporta. Não o que seu corpo pode parecer para você. Por que do outro lado há muitos já libertos desta tolice - ou então não seria Naturismo. Derivado de Natural.

Não seria cínico dizendo que numa praia naturista ninguém olha ninguém. Não. Ali todo mundo olha todo mundo. Ou não seriam dotados de dois pares de olhos perfeitos. Mas daí a um homem ou mulher desejar possuir essa ou aquela pessoa, só por estar com seu corpo exposto e por isto se achar no direito, sem esperar o momento oportuno, quando couber, e se couber, além de longe dali, como naturalmente não se vê nas baladas, nas casas de shows – com roupa e tudo -, há uma distancia muito grande. É muito, mas muito diferente do que se pensa e que até alguns propagam ou vão pra lá pensando que seja por aí.

Pois a primeira vez aqui se refere a uma menina-mulher, levada pelo que não sei se seu familiar ou não – como tantas outras famílias inteiras que freqüentam o lugar, que tirou a roupa, muito naturalmente, diante dum punhado de gente que ela jamais tinha visto na vida. E com seu gesto deu um tapa na cara de muitos que até hoje, depois de séculos e secloros indo, e indo de novo a seja qual praia ou clube seja, ainda não se desvencilharam das amarras, de todas elas, mas que vivem a apontar, e se apontar, sobre isto ou aquilo.

Quando Cristiana tirou a roupa, sem considerar sua aparente tenra idade, se havia ali gente com sede soube disfarçar bem diante da jarra sobre a mesa. Mas não creio que entre os daquele grupo houvesse algum com a goela seca. Até por que ali não se vai para beber água. Mas para levar e dividir o que se sabe das trilhas que levam a uma fonte e não a uma caneca. Fonte que sacia muito mais que sede, que alimenta senhor qualquer que esteja aberto a se livrar das amarras que o tolhe de viver a vida o mais longe possível dos preconceitos. Sobretudo dos preconceitos consigo mesmo, dos preconceitos com seu corpo. O lugar, para os que não o depravam, faz libertar-se, sobretudo, da maldade. Tipo essa que, quem sabe, te invadiu quando leu sobre a primeira vez de Cristiana, na manchete do texto. Como se só houvesse primeira vez no sexo.

Uma vez de volta, e reencontrando meu velho amigo, este que se recupera muito bem dum câncer depois que voltou a se envolver com as questões naturistas - coisa que gosta muito de fazer, não resisti ao retorno, agora não como jornalista, mas como adepto, admirador, e defensor da filosofia, presente que me dou e que me deve ajudar a me livrar ou a minimizar as dores com as quais passei a conviver depois da cadeira-de-rodas, vá saber. O que me oportunizou conhecer Cristaina, e assisti-la dar seu show. Que tenho certeza terá acabado por agregar muito se pensado haver tantos de fora por causa dos de cima do muro ou que, deturpando o cenário, insistem em ambientar ali a consumação dos seus desejos sexuais reprimidos, desviando-se do agente da proposta. Que já não é mais uma proposta, vamos combinar, mas uma cultura solidificada desde há muito, apesar de você, como diz o cantor.

Em 1998 estive ali, onde deixei de está depois que sofri o acidente que me tirou os movimentos das pernas e mãos. Não lembro de nenhuma outra 'Cristiana' por lá naquela época. Mas recordo aos montes e não só daquele tempo mas também de agora, depois que voltei lá e desde que lá fui por duas vezes para colher informações, e cobrir um evento que publicaria no meu site de notícias, de gente cheia de pudor, e outros envoltos no manto da desfaçatez, mas que estavam lá, domingo sim, e no outro também. Só não queria se bater ali com nenhum vizinho. O resto tava valendo. Calma, que eu não vou vomitar.

A idade de Cristiana não me foi revelada. Mas ela é bem jovem. Quando a vi chegar, junto com um senhor, ainda não pude perceber a mulher que aquele corpo quase duma menina abrigava. O olhar pareceu-me ainda menos revelador. Posto que expressava o que parecia o sentimento duma garota ainda assustada. Talvez não pelo que estava para acontecer – o que eu, e talvez nem ela, sabia que aconteceria, mas por medo do mundo mesmo. Tudo nela indicava tudo menos tratar-se duma mulher bem resolvia, mas duma muleka que envergonharia, e quem sabe envergonhou mesmo, a senhoras e senhores, maiores de 40, 50, 60 anos, que participariam com ela, de perto ou mais afastados, de tudo aquilo e que prestaram atenção muita nela.

A ta, você cochichou com seus botões, mas eu ouvi bem claro a parte onde questionou se tratar duma "criança"que ainda não sabe nada da vida. Até ia te sugerir que conhecesse a moça e, salvando a devida proporção, abrisse um diálogo com ela, sobre qualquer tema. Mas, diante do volume existente dos pouco abastados de memória e raciocino, mais claramente, de inteligência, e da iminente possibilidade de tratar-se o/a nobre dum destes desventurados, acabo por repensar, pois vergonha é coisa que não desejo nem a um inimigo, passar.

- Toda sorte do mundo a você, Cristiana, querida, dentro desta e de todas as searas da vida...