Baile de máscaras

As imagens formam conceitos, estabelecem opiniões, atraem ou repelem as pessoas. As embalagens estão aí para constatar isso. Cada vez mais sofisticadas, mais sedutoras e chamativas, elas reclamam sofisticadas estratégias e avançadas tecnologias para suas elaborações. Traços, letras, palavras, cores, gravuras, marcas e logo marcas exigem além de um bom designer gráfico, aprimorada tecnologia.

É cada vez mais comum o investimento na embalagem humana. Além das indumentárias há também as cirurgias plásticas, as maquiagens, as academias, os salões de beleza, o personal trainer... Oficinas e profissionais que constroem estonteantes embalagens humanas.

E quanto ao produto? O estojo é lindo, mas o diamante é verdadeiro? Está bem lapidado?

Não! Não está e jamais estará. E daí? Babaquice!

Deixemos de bobagens e aprendamos de uma vez por todas a conviver e aceitar com mais naturalidade os tropeços, os desvios que todos nós cometemos e possuímos.

É muita tolice de nossa parte permitir que os conhecidos e comuns lados sombrios, característicos aos da nossa espécie, nos deixem tão decepcionados e perplexos. Esperamos fidelidade e retidão de seres imperfeitos, dominados por inúmeras tentações, arrastados por diversas inclinações que fogem por completo a retidão.

O melindre nos espreita nos mais corriqueiros atos desconcertantes.

Precisamos encarar essas condutas desagradáveis com mais naturalidade. Necessitamos desenvolver uma óptica mais humana e compreensiva para com todos os que agem equivocadamente.

Ora! Há algo de errado em expormos nossas malícias, nossas desconfianças em determinada situação?

Condutas medíocres, rasteiras e até hediondas são indissociáveis da composição humana, todos possuímos algum reservatório de chorume.

Os tabloides sanguinários e as mídias apelativas que cultuam o malefício, inoculam em nossas mentes os germes da maldade, da malícia, da desconfiança. Estes também são mecanismos de defesas naturais, comuns aos que perambulam pela arena terrena.

Pasmamos quando aqueles que nos são caros, aqueles a quem devotamos carinho e admiração, deixam transbordar o asco “natural” que se acumula em algum âmbito do universo humano. Nesse momento balbuciamos “propaganda enganosa”

É chegado o momento de deixarmos de procurar nos outros a assertividade que não existe plenamente em nós. As melhorias são permanentes, as reformas são constantes. Não existe lapidação conclusa, pois a tortuosidade jamais deixará de fazer parte de nossa espécie, o que existe mesmo e em abundancia é falso moralismo e melindre, muito melindre.

Ao nos melindrarmos com esses fatos, fomentamos a falsidade e espalhamos sobre o balcão da convivência inúmeras máscaras, obrigamos o “contraventor” a usar uma delas em substituição a autentica. Trocamos o amargo curativo pelo mel cancerígeno. Até quando manteremos içada a bandeira da fraude em detrimento a da autenticidade?

Precisamos dar uma “força”, um “gás” a nova era que se apresenta. Com “aquários” tudo será melhor, inclusive nossa compreensão, nossa capacidade de aceitar com brandura os equívocos, nossos e os alheios.

Você é ingênuo e inocente ou possui vestígios de sagacidade, de malícia no produto que és?

Entre em seu camarim psicodélico, sente-se diante do seu espelho contornado por lâmpadas coloridas e inicie a retirada da tinta, da maquilagem de sua cara e depois que estiver com a face desnuda, sem o nariz redondo/rubro que arrancava gargalhadas da plateia, saia para que todos vejam suas rugas de desconfianças, suas olheiras construídas em noites insones, quando maquinavas tuas vinganças; suas cicatrizes obtidas em confrontos que nasceram do teu desvio de caráter, seu franzir de testa de ira e revolta, sua sobrancelha arqueada de indignação... Uns irão gostar de você, outros não. Até aí tudo normal.É inteligente e saudável saber que na atuação da vida nem todos o aclamarão. Tente não alterar as curvas da naturalidade.

O palhaço carismático e alegre não incorpora somente após a pintura, ele reside no mesmo ônibus que acolhe também o tarado, o maníaco, o calhorda... Nossas tendências elegerão um condutor. A arte de cativar carinho e admiração das pessoas advém de sua personalidade. Deixe-a aflorar mesmo que tenha acabado de acordar, mesmo que estejas com o cabelo desgrenhado, com os olhos remelentos.

Jamais conseguiremos deter essas avalanches de imagens que soterram e asfixiam a realidade, mas podemos e devemos enxerga-las sob um prisma diferente, desenvolver e usar um sentido diferente dos cinco que conhecemos para que dessa maneira possamos nos esquivar das ilusões que as imagens provocam.

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Uma barulheira penetrou pela basculante e inundou meu quarto. Caminhei em direção à janela. Sons de bumbo, trompete, tuba e clarinete se misturavam ao vozeirão que saída do auto-falante. Um circo acabara de chegar à cidade. Assim que me debrucei na janela ouvi os berros do amplificador de voz “...além de todas essas atrações ainda teremos a presença do renomado e carismático palhaço “Cara limpa”...”