E o amor o que é?

Com breves palavras minhas , que não são mais que palavras, ditas, refeitas, reescritas, silenciadas, conto o que ninguém contaria, ao menos em meio ao dia a dia turbulento de trabalhos, questionamentos e agitações. Embora o coração não pare e muitas vezes sobreponha seus gritos aos mais altos ruídos. Apesar desses ruídos ,tento contar, mesmo que a palavra se perca, o que vi e que me fez refletir sobre o amor ou a ausência dele.

Tudo começou quando saí de casa ontem mesmo, para ir ao trabalho. Apesar de ser cedo ainda, ouvi nitidamente a discussão. Um casal de vizinhos falava alto, ao mesmo tempo, xingando e reclamando sem parar, de forma que era difícil identificar o que era dito, ou o motivo da briga. Caminhei até o ponto de ônibus, achando que, talvez não fosse nada demais, já que os dois eram casados há bastante tempo e uma crise a essa altura, seria compreensível.

Chegando finalmente ao trabalho, o dia transcorreu normalmente, correria esperada, cobrança, prestações de contas e todo o resto. Ao fim do dia eu só queria uma coisa: Descansar. Ônibus cheio e um casal beijando-se no banco de trás. Beijo como se o mundo tivesse parado. Como se ninguém estivesse vendo. Só o etéreo e lábios molhados, abençoados. Lembrei do amor, tão esquecido em meu vai e vem corriqueiro. Nem lembro mais o que é isso. Enfim, as aleatórias flechas do deus criança bagunceira não acertam e nem são para todos.

Assim, desci procurando a tranquilidade de minha casa ao menos por algumas horas, até que meus serviços e ouvidos fossem novamente úteis, no dia seguinte. Só não esperava ver, depois de tantas horas o resultado da briga principiada pela manhã na casa vizinha. A mulher sentada a chorar na calçada suja e molhada pelo chuvisco. Enquanto chorava de cabeça baixa. Assustado, perguntei o que havia ocorrido.

Ela, sem responder e com os olhos vermelhos, olhou para a direita como que sinalizando com a cabeça. Só aí percebi que sua filha, uma criança de dois anos de idade estava sendo levada por uma mulher alta, séria e apressada. Alguns instantes depois levantou-se e conseguiu mesmo desnorteada, me contar o que houve.

Desempregados ela e o marido já há quase três anos, deram a pequena Amanda para alguém que tivesse condições de mantê-la. A discussão era justamente sobre essa difícil decisão. A mãe era terminante e indiscutivelmente contra, porém o pai, sem ver outra solução, impôs a decisão como única possível. Assim, entrou silenciosa e com a cabeça baixa, depois a mulher já havia sumido com a criança em meio a neblina da rua.

Fiquei atônito, parado em frente ao portão vizinho tentando entender o que houve. Enquanto assimilava os últimos acontecimentos, ouvi de dentro da casa, as vozes, dessa vez mais calmas, que diziam - Eu amo a minha filha! E em seguida – Eu também amo. Saí calado em direção a minha casa perguntando se amor tem regra, padrão ou tamanho.Sem respostas ainda. Quem sabe amanhã? Por hoje banho e sonhar coma beleza e o desprendimento de um beijo dentro do ônibus.

Texto que participaria de concurso literário, não enviado por estar fora dos padrões ( tamanho maior que o solicitado ).