O Ciúme
 
"O amor bem-educado costuma deixar seu lugar para o ciúme, quando este se apresenta" (Félix Lope de Vega)

Só quem vive uma relação como refém do ciúme, sabe o inferno que é. É um sem fim de angústias, dúvidas e fantasias assombrosas.
Sérgio chegou em casa e encontrou Daniela deitada no sofá, nua, chorando. À sua volta, o caos. Parecia que o apartamento havia sido varrido por um furacão. Pensou em ladrões:
- O que houve? Fizeram alguma coisa com você? - perguntou, aflito.
- Quem é Lorena? - foi a resposta, os olhos injetados, um papelzinho rosa amarrotado na mão.
Demorou a entender e mais ainda a convencê-la da inocência. Ela, que há tempos procurava provas da traição, encontrou, num velho caderno, o bilhete da namoradinha do colégio. Enlouquecida, destruiu tudo o que viu pela frente.
Trauma de infância, dor de corno (gato escaldado...) ou medo de vingança, o que importa é que o ciúme dói. Impossível manter a bom senso diante da necessidade de cheirar roupas, vasculhar carteiras, bolsos, celular e computador em busca das evidências que não se quer encontrar. Se bem que, às vezes, vale a pena. Uma mulher provou a traição do marido pelos e-mails trocados entre ele e a amante e conseguiu arrancar-lhe uma bela indenização.
Se o ciumento sofre pela insegurança, seu parceiro sofre ainda mais. Nada do que faz tranqüiliza o outro e o resultado são brigas constantes e o conseqüente esfriamento do amor.
Érico, regulador, vigiava os passos da esposa, conferia o velocímetro do carro e sempre iniciava uma nova inquisição toda vez que ela rodava um pouco mais. O relacionamento foi se deteriorando, até que ela cansou. Ele quase enlouqueceu, pensou em suicídio. Enfim, superou. Na terapia, conheceu Dinorá com quem vive bem. Feia e insossa, ela foi a cura para o mal dele: ter ciúme de Dinorá seria como fazer seguro para uma Brasília 77, marrom.
Rubens Alves disse que o ciúme é a dor de perceber que a pessoa amada pode ser feliz sem a gente. Raul Seixas disse que "o ciúme é só vaidade".
Talvez. Mas, não é de todo ruim. Ser alvo de um pouco de ciúme é até lisonjeiro. Diz a voz do povo que "O ciúme é o tempero do amor". Precisa-se apenas tomar cuidado na medida para não desandar toda a receita.



Crônica publicada no Jornal Alô Brasília em 30/03/2013, e reeditado do texto homônimo, publicado neste Recanto em 14/06/2010.