A PERIGOSA BELEZA DO ESPELHO

Há muito tempo não me olhava no espelho. E acredito que a surpresa que tive foi de ter visto outra pessoa, às vezes quando aprendemos a nos conhecer melhor acontece a incrível sensação de que nada sabemos a respeito de nos mesmos. Existem poemas que explicam a beleza do que está lá, mas somente a alma pode ver, e isso é verdade, do contrário um cego não teria experiência de beleza. Penso nisso enquanto olho para o espelho, e se vejo outra pessoa é porque minha alma esteve distante do meu ser físico ou dos padrões dessa sociedade material, por isso não me acho belo. Quando nada mais é suficiente para suprir a necessidade de beleza do nosso corpo físico, milhões são gastos para aperfeiçoar novos produtos cosméticos, a indústria da moda cuida de impregnar novos conceitos. Mas existe uma forma de beleza que vai muito além de tudo o que conhecemos; essa beleza tenta ser traduzida para o meio material através desses métodos que falei. Mas a beleza é algo que não pode ser tocada, se pudesse, ainda na mitologia grega, a imagem de Narciso teria saltado para fora da fonte e também se apaixonado por ele. Nossos reflexos não são nada mais que uma miragem, afinal, espelho não tem alma, (exceto o do conto de branca de neve). A verdadeira experiência de beleza surge de dentro de nós, não de fora, não de uma imagem específica, mas do que ela representa para nós. Por isso devemos cuidar de nossas representações internas como partes de nossa alma. O grande Rubem Alves disse: “a alma humana é como um lago tranquilo que quando remexido libera o lodo que tem no fundo”. Uma grande metáfora para explicar o que somos. Por isso não cuido mais de meu espelho, agora ele está ficando enferrujado; no centro, encontro algumas bolhas de ferrugem tentando escurecer minha imagem, são marcas do tempo, sobre o espelho, ou será sobre mim? Acho que a ferrugem atrapalha a visão da imagem dos que enxergam apenas com os olhos. Existe uma imagem que a ferrugem do tempo não pode apagar sobre nós! Talvez pensasse isso o autor de Doriam grey, mas quando uma imagem é impedida de ser dinâmica ela acumula uma dor interna e toda a sobrecarga não pode ser vista, pois as ferrugens se esconderam atrás da imagem. Temos então dois seres: a figura de Doriam que permanecia jovem e a pintura que envelhecia e escondia suas ferrugens, e por fim a alma morreria somente quando encarasse as ferrugens da imagem antes paralisada. Assim são pessoas que não conseguem se enxergar de outra forma senão com os olhos físicos. Por isso Doriam foi destruído, ele era tão apegado a própria imagem perfeita que ao encarar seus maiores medos, e não ter carregado consigo a aceitação, a ferrugem saiu do quadro e foi para si e o consumiu. Acho bobagem acreditar que uma vida sem zelo por sua aparência é feliz, acho que o contrário é vivenciado por poucas pessoas no mundo, que sorte deles não? Não me excluo do rebanho, devo confessar que no fundo do meu lago também existe um Doriam grey, alguém que quer ser admirado, contemplado por todos; só que não pagaria o mesmo preço de Doriam: ser contemplado por todos exceto por mim mesmo. Gosto de pensar que encarar o que não pode ser mudado, é aceitar que as ferrugens quando consomem o espelho não podem ser tiradas, e elas não são prejuízo para nós, pois nossa verdadeira essência ainda está lá esperando para ser enxergada pelos olhos da alma.

Tesla da escrita
Enviado por Tesla da escrita em 16/03/2013
Código do texto: T4191861
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