DIVÃ (EC)

Yeda não sabia de Wanda, que não conhecia Karla.

Ao que se saiba, era verdade.

Victor, sim, julgava saber segredos das três.

Mal sabia o que lhe esperava.

Divagando:

Embora possamos nem perceber, somos passageiros do mesmo trem.

Vagões e horários podem ser diferentes.

Itinerários diferentes.

Mas, a física garante:

Sentidos iguais em direções opostas têm seu ponto comum.

Paralelas encontram-se e o trem da vida apronta das suas...

Voltando ao Victor:

Elas tinham horários diferentes.

Um mesmo local comum.

Nunca os quatro ao mesmo tempo.

Para paz de Victor, elas não sabiam uma da outra e nunca deveriam saber.

Victor atendia uma de cada vez.

Mesmo porque três mulheres, fetiches à parte, é um passo para confusão.

Victor, como é da natureza humana, só tinha dois ouvidos para ouvir segredos entre tantas outras histórias que conhecia da intimidade delas.

Jamais se misturar às questões.

Deveria sim, ficar de bico bem fechado quanto ao que lhe era desvendado.

Ossos do ofício.

Sabia disso quando optou por sua profissão.

Ao Victor cabia a árdua missão de fazer com que as pessoas que o procuravam, se reequilibrassem e encontrassem o melhor caminho.

Não revelar nem uma palavra do que ouvisse.

Paredes têm ouvidos e as construções, nestes tempos, têm paredes cada vez mais finas.

Já dizia o poeta: “Tem sempre um dia em que a casa cai!”

Carla, Ieda e Vanda, suas pacientes de análise, tinham uma cisma comum.

As três acreditavam que mudando seus nomes, alterariam a numerologia e a vida.

Numa sessão, Carla questionou se ele achava que passando seu nome para Karla, poderia mudar sua sorte.

À resistência lógica inicial do psicólogo, Carla argumentou o desejo de sua avó para que se chamasse Karla. Não foi possível, pois o escrevente, ao proceder o registro, alegou que a letra K não fazia parte do alfabeto. Com a reforma ortográfica, o K voltara e ela satisfaria o desejo de Dona Raphaella e, quem sabe, mudasse sua sorte.

Victor resignou-se:

“Faça o que achar melhor para você. O importante é estar bem”

Na semana seguinte, Karla fez questão que a secretária alterasse o nome na agenda de marcação de consultas. Estava tão feliz. Nem reparou a plaquinha nova à porta do consultório.

Reluzente, lá estava: Dr.Viktor.

Dias após, quase o mesmo se deu com a Ieda.

Argumentos da numerologia, o charme da letra Ypsylone, homenagem a sua madrinha, a finada Dona Sebastiana, adoradora de um bom xaxado e ela queria ser Yeda.

“Faça o que achar melhor para você. O importante é estar bem.”

Na semana seguinte, o consultório possuía plaquinha nova à porta: Dr. Vyktor.

Vanda, mais atenta, impaciente de ansiedade, nem se sentou e questionou as alterações plaquetárias.

Vyktor, que não podia falar dos segredos das outras duas pacientes, argumentou que era para dar mais charme e diferenciá-lo.

Vanda animou-se e contou que sempre quis ter o nome com Dabliu. Segredou que invejava seu irmão Willian e, mais ainda, adorava quando sua mãe Wilma cantava-lhe a marchinha “A E I O U”. Ela se sentia a própria Juju.

“Faça o que achar melhor para você. O importante é estar bem.”

É óbvio! No dia seguinte, uma plaquinha nova à porta:

DR. WYKTOR.

Em letras maiúsculas.

O trem da vida foi andando, cada um em seu vagão na monotonia de seus trilhos.

O de Wyktor deu uma paradinha numa estação diferente. Num congresso de psicologia, cruzou com antigos colegas de oficio.

Foi logo assediado por eles, indagado das alterações em seu crachá.

Num vagão de assemelhados, sentiu-se livre para contar o caso.

Um desafeto de faculdade não resistiu:

“Aí, você aproveitou e saiu do armário!”

Gargalhada na geral.

O grilo falante acordou assustado e, todo saltitante na cachola, repreendeu:

Não falei? Não falei?

Quem mandou dar ouvidos àquelas doidas?

Eu avisei! Boca fechada não entra mosquito.

E agora? O que pensarão de você?

Bem lá no fundo batia shakespeareana e tormentosa a questão:

Ser ou não ser?

Quantas dúvidas, hein, Vic?

Já para análise!...

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Este texto faz parte do Exercício Criativo - Três Mulheres e um Segredo

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Pedro Galuchi
Enviado por Pedro Galuchi em 20/08/2012
Reeditado em 30/09/2012
Código do texto: T3839333
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