A arte de criticar o outro

Algumas coisas o brasileiro faz como ninguém. Uma delas é criticar o outro. Nenhum povo tem mais enraizada essa característica do que nós. Parece que na crítica ferrenha à outra pessoa mora a nossa remissão.

Outro dia resolvi sair de casa de jeans batido e chinelos. Uma coisa corriqueira, que tantas outras pessoas fazem nas manhãs de sábado ao irem ao supermercado. Mas esse fato me custou o dissabor de ouvir de uma conhecida que eu estava mal vestida para a ocasião: “Credo, nunca te vi tão mal assim... O que aconteceu? Dormiu bem? Como vai o casamento? Tudo bem que professor ganha mal, mas daí a sair de casa de chinelo de dedo? (risos)”.

As pessoas tendem a observar minuciosamente a vida das outras e depois fazerem uma análise detalhando o certo e o errado (geralmente só detalhando o que consideram errado). Isso porque o brasileiro não gosta de falar de coisas boas. Quem presta atenção ao trabalho feito por uma escola de sua comunidade em prol ao hábito da leitura? Ou aos estudantes voluntários que conseguiram ótima adesão à campanha de doação de sangue? Ou mesmo à indústria que conseguiu diminuir os poluentes lançados na atmosfera? O que vende é o que pode ser criticado: As falhas da educação, os problemas com a saúde pública, a destruição do meio ambiente.

Tudo poderia ter um atenuante se fizéssemos críticas construtivas. Críticas construtivas? Alguma crítica realmente pode ser construtiva? Parece-me desculpa para alfinetar alguém: “Não me leve a mal... É apenas uma crítica construtiva...”. E com isso as frases vão surgindo torrencialmente:

- Você fica melhor com o cabelo solto porque disfarça seu queixo duplo.

- Ela é linda, mas não vale nada.

- O prefeito não entende que precisa resolver o problema do lixo.

- Refaça seu texto. Não use tanto as suas ideias, procure se basear nas do autor.

- Não me leve a mal... É apenas uma crítica construtiva... Mas você poderia cuidar melhor do seu jardim.

E o mais interessante é que existem pessoas que estão se especializando em criticarem e serem boazinhas ao mesmo tempo. Coisa de brasileiro. Enquanto estão prestando atenção à outra pessoa não veem a própria futilidade.