Sozinhos

Todos gostariam de ter sua alma entendida. De sentir sua alma compartilhada com alguém.

Hoje me dei conta de que estamos irremediavelmente sozinhos.

Não existe o nós no sentido literal da palavra. Não fazemos parte do outro, nem ninguém faz parte de nós, como costumamos querer.

Somos seres sós, vivendo em sociedade, compartilhando sonhos e ideais em busca de um futuro menos solitário.

Talvez você, lendo isso, esteja prestes a abandonar a leitura, por achar o texto enfadonho e besta. Dê mais um tempinho. Deixa-me tentar te explicar essa minha teoria narcisista.

Cheguei à conclusão que estamos sós como seres únicos e individuais que somos. Eu estou só, mesmo tendo família. Sei que estou só mesmo ouvindo meus filhos correndo e fazendo barulho aqui perto. Estou só porque fui criada sozinha. Quando Deus me criou ele não fez uma alma coletiva. Ele me criou como ser único. Meu espírito, imortal e social, está só na jornada. A cada um de nós que está aqui na terra em busca de felicidade, amor, prosperidade, ele deu uma centelha divina e plantou em nosso coração o desejo de conviver em grupo.

Sabe quantas vezes reclamamos que o outro não nos entende? Que ele “não se coloca em nosso lugar”?

Mas como outra alma pode saber, sentir aquilo que sentimos? Como podemos ver sob a ótica do outro? Como podemos delegar a outra pessoa o poder de nos fazer felizes se somente nós, como espírito único, podemos fazer isso?

Ninguém pode garantir a felicidade de outra pessoa. Podemos apenas proporcionar momentos felizes. Fazer parte de uma cena da existência que foi feliz. Nada mais. E ainda assim continuamos sozinhos.

Quando penso em minha mãe, em como a amo, e que um dia eu fiz parte dela, mesmo que fisicamente, sinto um calorzinho gostoso no peito. Mas ela está só na sua jornada e eu estou só na minha. Podemos, sim, nos apoiarmos, chorarmos juntas e desejar do fundo de nosso coração toda a felicidade do mundo uma à outra. Ainda assim continuaremos sós.

Vejo meus filhos e sei que eles estão sozinhos. Como pais, estamos aqui para oferecer todo o suporte de que precisarem. Somente isso. Todas as suas vivências, escolhas e experiências será um caminho solitário rumo ao aperfeiçoamento. Não poderei sofrer por eles, mesmo que sofra ao lado deles. E um dia chegarão a mesma conclusão que chego agora: saberão que estão sozinhos.

Nem marido, nem amigos, nem família. Ninguém caminha o mesmo caminho. Podemos até andar lado a lado, querer exatamente as mesmas coisas. Ainda assim estaremos sós, pois mesmo ao lado um do outro, as pedras que calcamos não serão as mesmas. A intensidade de cada experiência dependerá de nosso entendimento individual. E o aproveitamento da jornada será diferente para cada um.

Sabe aquele vazio que sentimos quando ficamos um tempo sozinhos? Aquela necessidade de falar com alguém, com qualquer pessoa? Você sabe o porquê de não conseguir ficar sozinho em casa sem ter a TV ligada ou música tocando? Isso se chama encontro com sua solidão, com sua individualidade.

Mas já não conseguimos nos ouvir. Ouvimos tantas pessoas, o mundo todo ao nosso redor, mas não conseguimos ficar em silêncio para nos ouvirmos. Foi exatamente aqui, nesse ponto, que paramos de ouvir Deus. De ouvir, porque falamos com ele o tempo todo, principalmente em nossas dificuldades... Mas não o ouvimos mais, apesar dele continuar nos falando.

Somos ridículos, de certa forma. Chegamos ao ponto de pagar a alguém para que nos ouça simplesmente para não ter de nos ouvirmos. Fico imaginando se todos pudessem parar, e no recôndito de sua mais profunda solidão, se ouvir. Quanta coisa nos seria revelada! Quanta crítica frente as nossas opções bobas de buscar a plenitude e quantas palavras doces de conforto e estímulo!

Descobriríamos que o que mais precisamos ouvir está dentro de nós mesmos.

Deus não erra. Se ele nos fez assim, seres individuais, e com esse desejo incrustado na alma de dividir com o outro nossa luta, ele tinha um objetivo. Não nos cabe entender ou julgar. A cada um cabe apenas a caminhada. E a solidão. Entender que a solidão que sentimos não é uma coisa ruim. É uma oportunidade de nos estudarmos, de nos entendermos. No fim mesmo, ninguém está só. Mesmo em uma ilha deserta, como único ser humano, não estaríamos sozinhos. Estaríamos em companhia de nós mesmos.