Mão Branca

O assassinato nunca mudou a história do mundo.

(Benjamin Disraeli)

Sábado em minha residência, eu conversando, como faço sempre, com meu amigo da velha guarda, Azambujanra, relembramos após 40 anos as manchetes dos jornais (anos 60/70). Recordamos da denominação “Mão Branca”, uma lenda para mim. Os jornais e rádios da época noticiavam que o codinome era em função da “luva branca” deixada sobre o corpo das vítimas. Mas Azambujanra contou sua nova versão, tim-tim por tim-tim.

Tudo começara no início da década de 60 e caracterizava-se, no Brasil, pelo movimento das Ligas Camponesas, greves sindicais e subversão hierárquica nas Forças Armadas. Dentro da ética militar se tornava um ato patriótico prender, ouvir sob coação e meter no xadrez os “subversivos”, as perseguições e mortes. Vantagem para as elites e seus companheiros internacionais. A cúpula golpista do Exército, com alguns elementos da polícia política, se entrosavam nos sindicatos, associações e outras entidades consideradas subversivas e que incomodavam às elites, ostensivamente.

Segundo ele, na época houve uma passeata de protesto liderada pela União Nacional dos Estudantes (UNE) pela Av. Guararapes, centro do Recife, rumo ao palácio do Governo do Estado. Por coincidência, um grumete ao passar fardado no meio dos estudantes foi filmado pelo serviço secreto do Exército que, automaticamente, enviou o conteúdo para o serviço de inteligência da Marinha. A alegação do grumete era o de que ia para o bairro do Recife antigo. A Associação da Marinha e Fuzileiros Navais, liderada pelo ex-cabo Anselmo, na época aclamado publicamente como inimigo do regime que viria a ser instalado em 1964.

Quando o regime militar subiu ao poder, uma das primeiras atitudes dos militares golpistas foi o expurgo dentro da caserna. Todos os militares envolvidos em movimentos considerados próximos à esquerda ou simpático ao governo deposto, foram expulsos das corporações, sendo presos e condenados. Surgiu então vários assassinatos, assaltos, explosões de bombas e seqüestros de embaixadores... Mas na verdade não foi somente Mão Branca, existia vários grupos de extermínio com esquadrões da morte que surgiram no cenário da polícia, que os mesmos telefonavam dizendo que havia um cadáver (na gíria deles “presunto”) em tal lugar e que o Mão Branca era o que tinha matado. Aí, todo mundo dizia que o matador era o Mão Branca. Centenas de criminosos foram mortos. Cabo Anselmo e o conhecido “Mão Branca”, fugiram da prisão inexplicavelmente. Azambujanra foi sabedor ainda que o ex-marinheiro, militante revolucionário Anselmo fugitivo de uma cela que possuía a chave da mesma. Já o ex-grumete, que fora humilhado, torturado teve o apoio da Associação da Marinha, por como já havia sido afastado da Marinha, preso e, desenganado achou por bem fugir como “Marreca” que nos anos 50 fugia da ex Casa de Detenção do Recife, num caminhão de mudança dentro de um guarda roupa, será que a polícia não sabia? A imprensa logo, logo, divulgava ter sido a fuga uma reza que o fazia desaparecer. Mão Branca era um assassino de sangue frio, revoltado, ele matava os bandidos mais perigosos e como vingança, que era o seu objetivo, marcava os corpos das vítimas com tinta spray branca: “MB”, para jogar os crimes envolvendo a Marinha do Brasil. O ex-grumete até hoje ninguém sabe se ele é vivo ou morto.

Escritor, poeta e teatrólogo. Blog Fiteiro Cultural : http://josecalvino.blogspot.com/

José Calvino
Enviado por José Calvino em 14/07/2012
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