Ameixas

Lembro-me das ameixeiras do quintal de minha casa. Ameixas de inverno. Amarelinhas. Doces e azedas. E de como eram indispensáveis em minha meninice. Eu vivia pendurada em seus galhos. No verão, brincando de esconde-esconde. No inverno, saboreando seus frutos. Bons tempos. Era um brincar diferente, de mães diferentes. Ficávamos o dia todo fora de casa. E só entrávamos quando minha mãe apontava na porta com o chinelo na mão. De vez em quando ele funcionava. Mas dez minutos depois já havíamos esquecido, ficando apenas o vermelhão nas pernas.

Como era gostoso esse tempo. Tínhamos tão pouco. Recordo-me que vivia com vontade de comer alguma coisa que meus pais não podiam comprar. Mas não me revoltava por isso. Era um querer de sonhar. De saber que um dia eu ganharia. Hoje meus filhos têm tudo. Não sabem o quanto era bom esperar pelo natal para comer um chocolate. Acho que lhes falta isso. Essa espera.

Minha mãe era uma mulher bonita e modesta. Modesta no vestir e no falar. De poucos sonhos e de algumas reclamações. Sempre cozinhou apenas o trivial. E comíamos arroz com feijão todos os dias. Ninguém reclamava. Ela era cordata e resignada à vida que tinha. Não me lembro dela ter plantado algum sonho em mim. Isso era coisa de meu pai.

Meu pai era um homem calado, muito calado. Sábio, ouvia a analisava tudo antes de falar. Acho que por esse motivo suas palavras tinham peso de lei. Não somente pelo autoritarismo, mas pela lógica incontestável de seus pensamentos. Eu o amava e admirava. E partiu cedo demais. Ele mostrava na prática, com exemplos, aquilo que não proferia em palavras. E como era honesto e bom! Acho que conheci apenas um homem tão honesto e de bom coração como meu pai. Estou casada com esse homem.

Meus irmãos e eu éramos crianças simples. Nossos brinquedos eram pedras, árvores e pernas. Corríamos o dia todo, nos sujávamos e nossa mãe nem ligava (e olha que ela lavava nossas roupas à mão!). Éramos livres. Agora as crianças estão confinadas dentro de suas casas, presas a toda sorte de tecnologia. Não acham a mínima graça em subir numa árvore. Quanto desperdício!

Vez ou outra ainda me aventuro em colher ameixas. Já não subo mais em seus galhos. Apanho apenas aquelas que alcanço. Elas não têm mais o mesmo sabor. Falta aquele encanto, aquele contato bom com a natureza. Falta subir no pé. Tentei explicar isso ao meu filho. Ele achou graça e quis me convencer que é mais fácil comprar ameixas na feira: “Mãe, você está muito pesada pra subir no galho”. E nem passou pela sua cabeça que ele poderia fazer isso. Ele é de outra geração. A geração dele compra ameixas pela internet.