Dia chuvoso

Interessante como um dia chuvoso pode ser ensolarado.

Parece que as pessoas tendem a detestar o dia cinzento. A menos que possam passá-lo na cama. Todos desejam dormir um pouquinho mais quando amanhece chovendo. Se for de segunda a sexta, claro. Porque se for no final de semana, com ou sem chuva todos pulam da cama para fazerem coisas mais interessantes que dormirem. Dilema do ser humano.

A segunda é detestada porque se está cansado do final de semana e começando outra semana. Todos odeiam a segunda. E começam a semana de mal com a vida. Não conheço ninguém que, no domingo a noite, comente: "Que bom! Amanhã é segunda-feira!"

As pessoas não se lembram de agradecerem por acordarem cedo. A oportunidade de estudar, trabalhar, ou simplesmente viver, não fala mais alto do que a oportunidade de reclamar, de fazer-se vítima da sociedade. Pobre segunda. Feita para ser o estopim da preguiça.

Todos gostam mesmo é da sexta-feira. Final de semana chegando. Nada de trabalho. Esquecem como é importante o trabalho. Brasileiro trabalha obrigado. Não sente prazer em ser útil. Não se realiza no trabalho a menos que seja financeiramente. E alguns gostam tanto de seus empregos que até trabalham de vez em quando, principalmente no setor público. É interessante como a fisionomia de uma pessoa que inicia a manhã de segunda é diferente daquela que inicia a manhã da sexta-feira. O intervalo entre segunda e sexta não existe. Sobrevive-se a ele. Nada é válido para lembrança. Mas se algo acontecer na segunda ou na sexta, todos com certeza vão comentar até acontecer algo mais interessante.

Sem contar nos colegas de trabalho crocodilos. Se acontecer algo ruim com alguém do setor que você trabalha, mas esse fato render uma folguinha, todos vestem uma máscara de solidariedade e vertem lágrimas quando, na verdade, estão exultando por dentro: "Morreu o marido da Glorinha. Querida! Vamos ao velório, ninguém mais trabalha hoje."

Nossa consciência nos faz passar na floricultura e comprar um vaso de dez reais e passar quinze minutos ao lado da viúva. Depois saímos de fininho, aproveitando o restante do dia em casa. Ou na praia. Ou no shopping. Isso se o dia for ensolarado.

Se o dia for chuvoso, pensamos na benção que é poder ir para a cama. E ele fica ensolarado pelo prazer de poder não fazer nada. Meia hora depois estamos entediados. Levantamos, perambulamos pela casa, abrimos e fechamos a geladeira umas mil vezes na ânsia de não ter nada para fazer. E começamos a reclamar da chuva. Tempo doido!

O dia simplesmente voa. Anoitece e você percebe que nada fez de útil. Queria ter feito o barradinho de crochê na toalha que ganhou de amigo secreto. Ou lavado aquele casaco que está cheirando o mofo de quatro invernos. Ou depilado as pernas. Mas não deu tempo de fazer nada. Sua necessidade de ficar "de boa", aproveitando o dia, fez com que você ficasse à toa. Isso seria bom se não fosse frustrante depois. Então você se promete aproveitar melhor sua próxima folga. E num momento de egoísmo pensa que feliz mesmo é a Glorinha, que vai ficar sem trabalhar oito dias.

Amanhece novamente. Não é segunda, mas tem gosto de segunda. O gosto amargo de ter de voltar ao trabalho. Todos chegam reclamando. E você repete a velha frase: "Êita chuvinha boa pra dormir."

Todos cumprem maquinalmente suas tarefas, forçando um sorriso de prazer no que se faz. E esperam longamente pela sexta-feira. Esperam como um condenado espera pela liberdade. Esperam pelo prazer de serem donos do seu tempo. E de poderem desperdiçá-lo bem.