CRÔNICA PARA UM ATO SÓ
 
              
           As horas que se passavam naquele dia não esperavam por ninguém. Alguma coisa dentro de mim relutava contra o tempo apressado, mas que se arrastava diante de meus olhos apreensivos. Um antagonismo nascido do "querer ver" com o "não poder ver". Assim mesmo meu ser continuava com a discreta esperança, uma luzinha no fim do túnel, um raio de sol em meio a tantas nuvens escuras. A vontade de te rever era absolutamente imperiosa, no entanto a tua ausência confirmada pela distância de teus olhos brilhantes, escurecia de vez minha ansiedade aflita, cedendo lugar à meus sentimentos platônicos outra vez. Tudo parecia misturar-se à minha frente, os acontecimentos giravam em torno de mim como tufões violentos arrancando minha paz inacabada. Os sonhos povoavam a minha cabeça, e minha cabeça perdia-se na imensidão de tua voz para encontrar-se no eco de tuas palavras carinhosas na direção do infinito.
 
                 O relógio me cobrava as minhas obrigações, e confirmava a tua distância física naquela tarde. Meus olhos não tinham os teus olhos, meus olhos não tinham o teu rosto de menina e mulher. Eu estava prisioneiro agora de recordações doces, que me machucavam lentamente como uma saudade que corta feito navalha afiada. O por do sol tinha uma cor diferente. Ele parecia mágico, escondia alguma coisa por trás de sua capa nostálgica, alguma coisa que meu ser insistia em descobrir. Aquela magia era diferente de todas as outras cores de por de sóis que eu conhecia. Mas o que seria? Eu não conseguia compreender de imediato.
 
                Foi aí que o enigma do sol aos poucos parecia se decifrar diante de meu ser pensante. Aquela cor agora brilhava mais forte, mas com uma suavidade perfeita. Tudo parecia claro, e cada vez mais claro. Percebí que aquele por de sol era uma crônica para um ato só, o ato de meu ser poder sentir saudade. E minha saudade era justamente todo aquele brilho que estava frente à meu ser na mais pura forma de te desejar perto de mim, com teu inconfundível sorriso de criança feliz, a iluminar-me nesta triste, amarela e longa tarde de saudade eterna.
Ricardo Mascarenhas
Enviado por Ricardo Mascarenhas em 03/05/2012
Reeditado em 26/10/2020
Código do texto: T3647326
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.