Não Me Peçam Para Que Eu NÃO Seja Preconceituoso!

“Definitivamente não! Não me peçam para que eu NÃO seja preconceituoso, porque somente posso sê-lo e não há quaisquer possibilidades de que não o seja”.

A citação acima poderia facilmente ser empregada como argumento incontestável de uma pessoa altamente preconceituosa e a favor do extermínio do objeto de sua discriminação.

Aparentemente, pode parecer loucura. Todavia, não o é.

Vivemos em uma sociedade formada por indivíduos covardes, com um teor altíssimo de medo de si próprios, além de serem cínicos, dissimulados, falsos e hipócritas.

O caro leitor, certamente, ao chegar a este trecho do meu artigo, deve ter interrompido a leitura e se perguntado quem sou eu para fazer tamanhas acusações e afirmativas. Também deve ter me achado uma pessoa metida, pretensiosa e que pensa ser melhor do que as demais.

Responder-lhe-ei. Sou uma pessoa comum tal qual a você, seus vizinhos e aqueles que os cercam. Por esta singela razão sei do que digo, pois também possuo, intrinsecamente, em meus genes, o cinismo, a dissimulação, a falsidade e a hipocrisia.

Ao partirmos de tal premissa, retomo a exclamativa inicial e explico-me melhor.

Nossa sociedade é formada basicamente por regras que servem como diretrizes em nossas vidas. Formulamos padrões do que consideramos ser melhor: modelos de vida, de profissões, de atitudes, e, desafortunadamente, de seres humanos.

Isto acaba tornando-se um erro incauto.

Por tal razão é que aquelas pessoas que se enquadram nas padronizações podem se voltar contra aquelas que não se enquadram. Elas são vistas como o almejado protótipo da perfeição. Também são a maioria. Podem tratar a todos como bem pretenderem, pois, apesar de serem preconceituosas, agressivas, violentas e ignorantes, pelo menos, elas possuem coerência em seus pensamentos, caracteres, atitudes e ideologias.

Eles dirão: “Como exigem que nós, (a maioria, os normais), entendamo-los, tratemo-los com igualdade, respeito e compreensão se eles próprios não se tratam igualitariamente nem se respeitam e compreendem-se”.

Eles estarão certos, porque é a mais absoluta verdade. As minorias – ao invés de se unirem em busca de justiça, igualdade e força – atacam-se, ofendem-se, digladiam-se.

Mulheres discriminam gueis que, por sua vez, discriminam lésbicas que discriminam alcoólatras que discriminam viciados que discriminam mães solteiras que discriminam travestis que discriminam deficientes físicos que discriminam prostitutas que discriminam pobres que discriminam negros que discriminam protestantes que discriminam espíritas kardecistas que discriminam candomblecistas que discriminam umbandistas que discriminam católicos que discriminam judeus que discriminam muçulmanos que discriminam ciganos que discriminam índios que discriminam albinos que discriminam deficientes mentais que discriminam aidéticos que discriminam africanos que discriminam norte-americanos que discriminam latino-americanos que discriminam asiáticos que discriminam europeus que discriminam qualquer um dos que foram citados anteriormente. Deste modo, o círculo vicioso de incompreensão, ignorância e intolerância refaz-se.

Tanta incompreensão de uns para com outros é a mais absoluta estupidez. Do que essas pessoas têm medo: dos discriminados ou de si próprias?

Será que elas não percebem quem em esta vida tudo está regido pela Lei de Causa e Efeito, pela lei de Ação e Reação?

A sabedoria popular já nos alertava sapientemente: “não cuspa para cima para que não lhe caia na testa”.

Ela estava certa, pois o que pode não ser perceptível é que a vida possui justiça implacável, e, se alguém discrimina tão cruel e ferreamente a um deficiente mental, esta mesma pessoa pode vir a ter um filho em tal condição. A mesma é válida também para aqueles que são homofóficos, porque podem ter filhos gueis ou filhas lésbicas e não lhes cabem não aceitarem e serem intransigentes. Seus filhos possuem livre-arbítrio e sexualidade livre e única. O que os apraz ou lhes causa prazer (tesão), o que manifesta e desperta suas libidos é algo particular, em virtude da alma e corpo deles serem individuais e independentes dos próprios pais. Logo, aquilo que pode estimular seus pais ou mães, pode não estimulá-los.

Toda essa incompreensão torna-se mais ridícula e absurda, sobretudo para aqueles que se dizem adeptos de doutrinas reencarnacionistas. Por que ser preconceituoso com um indivíduo devido a um traço que o torna distinto? Ele assim pode sê-lo, porém, jamais, pior do que nós próprios. Creio que, em esses momentos, a doutrina na qual essas pessoas dizem crer é totalmente esquecida por eles. Caso se lembrassem dela, perceberiam que, futuramente, poderiam passar pela mesma discriminação – obviamente em vidas porvindouras. Ou, ainda, podem ter tamanha aversão por elas porque já sofreram tal discriminação em suas vidas pretéritas, logo, o reflexo de afastá-las, repudiá-las, em esta vida, funciona como um reflexo de auto-defesa com o qual procuram se afastar daquilo que, inconscientemente, é visto como motivo de dor e perigo. Esta defesa, talvez, seja até para que não voltem a cair nos mesmo erros e cederem aos instintos que trazem latentes dentro de si próprias e que apenas esperam o instante propício – o ápice ou um momento de descuido na vigília imposta por seus próprios inconscientes – para eclodirem.

Todavia, até que os próprios discriminados não se unam e tentem combater através da união o preconceito que sofrem, estou absolutamente de acordo com os preconceituosos, discriminadores, intolerantes e intransigentes. Eles, pelo menos, como já foi dito anteriormente, são coerentes com aquilo que julgam ser suas consciências – na realidade, nada mais nada menos do que suas auto-defesas -, caracteres, pensamentos, atitudes e ideologias.

Portanto, é que sou enfático quando volto a repetir ao caro leitor:

“Definitivamente não! Não me peçam para que eu NÃO seja preconceituoso, porque somente posso sê-lo e não há quaisquer possibilidades de que não o seja”.

GLOSSÁRIO DE “NÃO ME PEÇAM PARA QUE EU NÃO SEJA PRECONCEITUOSO!”

*Incontestável = que não pode sofrer contestação; não contestável; indiscutível.

*Todavia = mas; porém; contudo; no entanto; entretanto.

*Caro = querido; amado.

*Cercar = rodear; cingir; circundar.

*Singela = simples.

*Intrinsecamente = interiormente; intimamente.

*Premissa = fato ou princípio que serve de base à conclusão de um raciocínio.

*Diretrizes = conjunto de instruções ou indicações para se tratar e levar a termo um plano, uma ação, um negócio, etc.; diretiva.

*Desafortunadamente = sem sorte, azaradamente; infelizmente.

*Incauto = não acautelado, imprudente; crédulo, ingênuo.

*Enquadrar = inserir; incluir.

*Almejado = desejado ardentemente; desejado com ânsia.

*Protótipo = primeiro tipo ou exemplar; original, modelo.

*Coerência = ausência de contradição; acordo do pensamento consigo mesmo.

*Caracteres = elementos individualizadores de uma pessoa, animal ou coisa; qualidades; características.

*Ideologias = conjunto articulado de ideias, valores, opiniões, crenças, etc., que expressam e reforçam as relações que conferem unidade a determinado grupo social (classe, partido político, seita religiosa, etc.) seja qual for o grau de consciência que disso tenham seus portadores.

*Ao invés de = ao contrário de; ao revés de.

*Digladiar = discutir com calor; disputar, combater, contender, lutar.

*Sapientemente = sabiamente; eruditamente.

*Perceptível = que se pode perceber.

*Implacável = que não se pode aplacar ou abrandar; que não perdoa; inexorável.

*Ferreamente = cruelmente; duramente; desumanamente.

*Intransigentes = que, ou pessoa que não transige; intolerante; austero; severo; rígido; ríspido.

*Apraz (aprazer) = causar prazer; ser aprazível (prazeroso); agradar; deleitar.

*Libido = instinto ou desejo sexual.

*Em virtude de = em consequência de; por causa de.

*Adeptos = partidários; sectários; sequazes; prosélitos.

*Doutrinas = conjunto de princípios que servem de base a um sistema religioso, político, filosófico, científico, etc.

*Porvindouras = que há de vir; futuras.

*Pretéritas = que passou; passadas.

*Repudiar = rejeitar; repelir; recusar.

*Latentes = que permanece escondido; que não se manifesta; oculto; disfarçado; dissimulado.

*Propício = favorável; adequado; apropriado; oportuno.

*Ápice = o mais alto grau; apogeu (o auge).

*Descuido = lapso ou distração do espírito; falta de cuidado.

*Vigília = desvelo; cuidado, dedicação.

*Eclodir = surgir, aparecer; desabrochar, desabrolhar.

*Enfático = que tem; ou em que há ênfase (energia excessiva na gesticulação ou na fala; realce, destaque, relevo).

Frida Pascio Monteiro
Enviado por Frida Pascio Monteiro em 03/02/2012
Reeditado em 07/01/2015
Código do texto: T3478278
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.