C E L U L A R

Com este aparelho de telefonia móvel, meu celular, número e prefixo já fixados, posso falar com quem eu quiser? Vivos e mortos? De perto ou de muito longe? Com quantos? Em números reais, esta telefonia móvel me garante o quê? Recepção otimizada? Contatos imediatos? Posso ficcionar? Posso inventar conversas e longos diálogos com os espectadores ouvintes deste programa sem noção, num emaranhado de palavras impregnadas do perfume de todos os estilos?

Com este aparelho posso cantar?! Este aparelho celular!, esta voz que não quer calar!? Intrépido, entupido de aventuras, quero falar com todo o mundo, todos os mundos.

Mudo, tento ligações planetárias e interplanetárias por pura diversão, distração, mesmo ausente, vivo o presente, quase passado, quase futuro, mistura de troglodita e mutante, de tanto ser real, virou ficção, e o contrário também, de tanto tentar ser, desmaterializou-se.

Vou perguntar outra vez, com este aparelho celular, posso comunicar comigo mesmo? Sempre? Mesmo sem bateria, descarregado, morto?

Com este aparelho de telefonia móvel, imóvel posso me perguntar, posso me questionar, pressionar? Posso o quê? Até quando? Não responda.

Vou direto, como uma flexa atirada, sem volta, perguntar, flexionar, questionar o questionário, questionar o dicionário.

Vou (re) perguntar: estou vivo ou morto, com este celular? Morto vivo. Sem sinal.