Festas juninas – Tradição cultural

Quando me recordo das festas juninas em minha infância, não tenho como não sorrir. Todo meu corpo reage resgatando emoções únicas que experimentava então.

Após a morte de meu pai, fomos morar na chácara de meus avós. Chácara “Santo Antônio das Graças”.

Sempre me perguntei por que a maioria dos sítios e chácaras trazem o nome de algum santo. Hoje, mais velha, e assistindo o comportamento dos sem terra, tenho minhas desconfianças da razão desta atitude. E reforço meu raciocínio quando observo o nome dos assentamentos... Bem mais isso é outra questão.

A chácara de meus avós ficava em Cotia, uma cidadezinha perto de São Paulo, o que favorecia em vários pontos nossa vida. A escola era pertinho da chácara, quase plantada no centro da cidade; e a distância da capital era facilmente contornável, o que facilitava o trânsito de minha mãe, que trabalhava em São Paulo.

Talvez, meu amor pela natureza, a identificação que sinto com o campo, tenha nascido nos quatro anos e meio que moramos lá. Era um lugar especial.

Uma casa rodeada de alpendre, jardins repletos de flores coloridas, emoldurados com cercas brancas; um pomar que era quase uma “floresta” já que contava com uma enorme quantidade de árvores frondosas e frutíferas. Havia uma escadaria que para mim parecia aquelas que se vê em desenho animado, onde princesas frágeis aguardavam o príncipe encantado. E para completar, um ribeirão cortava a extensão da chácara onde vovó conseguiu não sei como, plantar um mar de “mariquita”, como nunca vi em lugar nenhum. Aquilo era um tesouro inestimável que não cansava de me causar impacto sempre que ia até lá.

Era nesse cenário que vivíamos, e que eu e meus cinco irmãos, aguardávamos com ansiedade a festa junina que vovô organizava em grande estilo.

Nem preciso dizer que a festa era comemorada no dia 13 de junho, dia de Santo Antônio. Os preparativos nos deixavam alertas como se fosse o prenúncio de algo maravilhoso. Vovô reunia muitas pessoas e começavam os arranjos. O mastro e a fogueira enorme. Interessante que quando somos crianças tudo tem proporções gigantescas. Lembro-me do tamanho da fogueira. Eu imaginava que se continuassem por mais uns dias encontrariam a porta do céu!

O local onde eram montados os fogos era proibido para nós, então de longe observávamos fascinados, eu e meus irmãos, toda a movimentação. Vovô era cuidadoso e fazia tudo com muito zelo. Cadeiras, acomodações, mesas para os quitutes, tudo era organizado com antecedência. Enquanto isso, vovó e minha mãe junto com ajudantes se encarregavam do cachorro quente, quentão, e doces e mais doces típicos. Ah! Para mim o ponto alto era a pipoca, nada é mais gostoso que pipoca em festa junina e até hoje sou viciada em pipoca!

A festa era bem à noite, ou pelo menos era como me lembrava, parecia que não ia chegar nunca. Quando finalmente começava ficávamos perdidos em meio a tantos adultos e como éramos seis, pelo menos tínhamos companhia, pois não havia quase criança.

Nada era tão estimulante quanto ver levantar o mastro. Havia reza, e certo ritual, pois ficávamos fascinados, entretidos no levante do mastro com a bandeirinha retratando Santo Antonio. Depois sim, vinham os fogos.

Em minha memória tudo era muito lindo, colorido e mágico. Sempre me liguei a fogos. Ninguém me tirava de lá quando começava a queima de fogos. Meus olhos pareciam que iam até o céu e misturam-se naquela diversidade de cores, permitindo-me senti-la além de vê-la e isso provocava em mim uma sensação tão deliciosamente livre que adorava e fica entristecida quando tudo se acabava. Depois vovô nos chamava e era nossa vez. Biribas, estrelinhas, chuvas de prata... Eram distribuídos para nos e tínhamos permissão para estourar tudo. Que delicia! Claro que não tinham a beleza e grandeza dos fogos dos adultos, mas tinham seus encantos e o que era melhor, nos proporcionavam espaço para reinarmos um pouco, uns aprontando com os outros.

A comilança era mais animada entre os adultos. Distraíamos-nos com a pipoca, e os doces caseiros que meus irmãos gostavam. Após brincarmos bastante com os fogos, beliscarmos guloseimas que nos apeteciam, então éramos convidados a nos deitar e íamos todos felizes, porque havia um encanto especial em se deitar e ouvir os rumores da festa no terreiro. Os quartos davam para a varanda e pela janela íamos ouvindo os rumores música e conversas. Vovô tocava violão e havia outras pessoas que o faziam também, e havia um sanfoneiro, claro, não poderia faltar.

Lembro-me da sensação gostosa e acolhedora de embalar meu sonho nestes sons tão gostosos de se ouvir.

Hoje já não temos mais a Chácara do vovô que se transformou num asilo, e muito bonito por sinal; meus pais e avós já se foram, mas permanece ainda bem forte a presença destas criaturas alegres, amorosas e especiais.

Todo ano, vivo caçando festas juninas e lamento que não encontre mais comemorações neste estilo. As tradições vão se alterando conforme o tempo e penso que devemos nos acostumar com isso. As lembranças de momentos da infância, que são marcados pela amorosidade, alegria e bem estar, parecem ser as melhores companhias para quando nos tornamos adultos.

É isso, festa junina para mim é um ritual de amor, alegria, beleza e calor humano. Uma celebração do aconchego familiar e de expressão de amizade.

Priscila de Loureiro Coelho

Consultora de Desenvolvimento de Pessoas.

Priscila de Loureiro Coelho
Enviado por Priscila de Loureiro Coelho em 06/07/2005
Código do texto: T31809