VIVENDO E APRENDENDO

Às vezes, não sabemos por que momentos tão desagradáveis e constrangedores surgem em nossa vida. Um dia, em sala de aula, deparei-me com uma situação deveramente embaraçosa. Mas, quando se procura, acha. Digo, quando se quer mostrar o que na verdade não se é, a máscara cai.

Como era meu primeiro dia de aula como estagiária, queria mostrar aos alunos que dominava os assuntos, e se possível até mais do que a professora regente. Por sinal, naquele dia, ela, a professora da turma, não comparecera por estar participando de um congresso sobre educação. Eu havia gostado imensamente por ela não estar ali logo no meu primeiro contato com os discentes. Afinal, ser observada quando se é incipiente causa desconforto.

Logo de entrada, dei bom dia, disse que iríamos trabalhar por apenas uma unidade, mas que eles iriam aprender bastante comigo. Um aluno, que tinha uma cara de quem nada queria, mas que no decorrer do processo foi um dos que mais contribuiu com as aulas, perguntou-me:

_ Professora, a senhora sabe como se escreve a palavra “jibóia”?

_ Claro! – disse eu me sentindo a dona do pedaço – e logo fui escrevendo no quadro:

J-i-b-ó-i-a.

O menino, todo sisudo, replicou:

_ Professora, a senhora já deveria saber que “jibóia” se escreve sem acento, porque com o novo acordo ortográfico os ditongos abertos “oi” não são mais acentuados em palavras paroxítonas.

Eu, toda envergonhada por não ter ainda me apropriado da nova ortografia, mas tentando arranjar uma resposta que me salvasse daquela saia justa, respondi:

_Eu sei que agora “jibóia” se escreve sem acento, mas temos ainda um ano para nos acostumar. Assim, por enquanto, podemos escrever segundo a antiga ortografia sem estar cometendo infrações gramaticais.

Procurei assim o mais rápido possível dar prosseguimento à aula. E, como forma de conseguir recuperar meu poder perante a turma, perguntei imponente ao mesmo aluno:

_ E você sabe o que é ufologia?

_Claro, professora, é o estudo de assuntos relacionados aos objetos voadores não identificados, ou seja, os OVNIS. E já que a senhora está falando nesse assunto, que tanto me interessa porque meu pai é um pesquisador nessa área, o que a senhora pensa sobre a hipótese interdimensional nesse estudo?

Meu coração gelou quando aquele irritante menino fez aquela pergunta, pois nada sabia sobre o assunto. Confesso que um dia antes tinha ouvido um colega de trabalho falar sobre a etimologia da palavra ufologia. Mas só isso e mais nada. A minha sorte foi que a diretora chegou e avisou aos alunos que todos deveriam ir para o pátio para o hasteamento da bandeira. Nessa hora, não tão poderosa, mas aliviada, disse:

_Amanhã conversaremos sobre as hipóteses acerca dos OVNIS, pois vou pedir uma redação a todos sobre esse assunto.

Na verdade, caro leitor, no meu primeiro dia aula aprendi uma lição de vida com um jovem de apenas treze anos de idade, ou seja, que não devemos nos sentir superior aos outros, querendo muitas vezes mostrar o que não somos.

Pensei que estava ali para ensinar, mas logo compreendi que ninguém ensina ninguém, pois o aprendizado é mútuo1.

1 Filosofia de vida do grande educador Paulo Freire: “ninguém educa ninguém, os homens se educam em comunhão”.

DENISE CARVALHO
Enviado por DENISE CARVALHO em 02/07/2011
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