pobre das galinhas...

Pobres das galinhas

Prezado leitor,nesta fase contemplativa de minha vida,lançando vago olhar ao passado,encontro pequenos,simples fatos que,apesar de inconseqüentes,posto que,em nada influenciaram,meu destino,assim,quero pensar...

Naturalmente,volto as costas para os teosofistas ,madame Blavasky,Annie Bésant que afirmam ,categoricamente,que os meros acontecimentos estão interligados e as reações de causa e efeito interagem no presente e no futuro,tomo a coragem para contar um fato que ,entre neblinas dos anos repousa no leito do passado...

Encontrava-me nos anos 70,acadêmico de medicina,debruçado sobre os compêndios de clinica medica,porem,as calças rotas e a necessidade em comprar livros,forçava-nos a exercer de uma forma um tanto,para não dizer,muitíssimo irregular ,a atividade de “medico”em cliniquetas empoeiradas da baixada fluminense.Nesta firme determinação,os três mosqueteiros empobrecidos,carentes,mas,que desejavam dominar a arte de Galeno,o Paulo Renato,o Marcelino e este narrador,nos apresentamos numa clinica com nome de santo.Alias,todas os nosocômios dos pobres recebem nome de santos.clinica santa Helena casa de saúde santa Terezinha,clinica São Marcos.Senti a falta do nome de São Elesbão nas fachadas...Na verdade,antigamente,os hospitais eram locais,onde se morria com gosto,funerava-se bem,ante a visão de bela imagem do anjo Gabriel ,com suas asas enormes brancas que faziam inveja ao pobre anjo Osvaldo...

Durante meses,dominávamos a região com nosso trabalho ilegal,porem,piedoso,uma vez,que o pobre necessita,em primeiro lugar de atenção,no que fazíamos esplendidamente e por certo,Hipocrates,Charcot Laenec,e outros abençoavam nosso mister.

Porem,não éramos serafins impuros e o Paulo Renato dentro do vistoso jaleco branco mantinha a mentalidade do pequeno moleque das ruas do Andaraí a usar atiradeira,comer atanajuras com farinha e outras aberrações.

Nos fundos do consultório,havia um quintal freqüentado por belas galinhas que bicavam pequenas bolotas,arrancavam tiriricas.Quando ,na ociosidade,abríamos a porta,as “ meninas” se apressavam e se aproximavam aguardando um punhado de milho.

Ah!Que a tentação luciferica de meu colega não tardou.Dentro das gavetas,existiam vidros de digoxina,medicação do grupo dos digitais,utilizado para dar “força” ao coração insuficiente,porem,tendem a provocar bradicardia,ou seja diminuem a freqüência cardíaca,podem provocar efeitos visuais ,dando um tom amarelado ao que vemos.

Pois bem,nosso colega abriu os vidros de digoxina e,tranquilamente,digitalizou as galinhas!As penosas,alegremente,engoliram vários comprimidos do digitálico...

Quando soubemos do acontecido eu e o Marcelino,após,repreendermos o autor da terapia intempestiva ,cuidamos de abandonar as “almas carentes” e procuramos outro porto seguro,distante de possíveis represálias...

Hoje,fico a imaginar o que poderia ter acontecido as galinhas ...

Minutos após,a “digitalização galinácea’,as frangas revirando os olhinhos,vendo tudinho “amarelinho”,tiveram alucinações semelhantes as do Van Gogh e imaginando-se em lindos campos de milharal,tombaram com as patinhas para cima,num galicidio coletivo,uma espécie de pacto religioso...

Perdoem-me os ignotos teosofistas se torno publicas estas narrativas...