Passeio no Bosque

08h40m

Cheguei bem adiantado na Brigadeiro e passei num mercadinho pra comprar um Toddynho. Tava R$1,49 e eu tinha R$1,50 no bolso. Entrei na fila. Só tinha a moça que já estava no caixa e a que estava na minha frente. Só que começou a demorar e eu deixei de ficar adiantado e passei a ficar em cima da hora. E comecei a me irritar com a demora. Quando fui ver, a fulaninha que já estava no caixa, estava pagando dois pacotes de bolacha água e sal com moedas de cinco centavos. Uma mulher que estava atrás de mim desistiu e saiu do estabelecimento xingando. A que estava na minha frente, na sua vez, ficou procurando o dinheiro na bolsa. Eu? Eu vi o código de barras do Toddynho sendo lido, e depois deixei as três moedas de R$0,50 na mão da caixa. Demorei cinco segundos.

*

20h45

Entrei no mercado só por causa da vontade de comer torrada com manteiga. Fui direto na torrada e já me encaminhei pro caixa mas acabei fazendo uma curva abrupta ao ver um baita de um rabo empurrando um carrinho. Adoro mulher empurrando carrinho de supermercado. Nisso, minha vontade de gastar transcendeu a vontade da torrada apenas e comecei a zanzar pelo lugar, procurando alguma coisa. Fiz mira numas xícaras, mas achei desperdício. O lugar estava relativamente vazio. Peguei dois danones de chocolate branco e fui até os caixas. Situação parecida com a do mercadinho da manhã: uma pessoa já finalizando a compra, e apenas duas moças, juntas, na minha frente. Com umas bundas bonitas e uns rostos de se jogar fora. Me desculpem, mas eu precisava falar isso. Daí que aconteceu de uma dessas belezinhas não lembrar da senha do cartão de débito. Daí ela digitou uma, digitou duas vezes... Quando acertou, o sistema veio com a mensagem de "transação não aceita". Aí, começou a ponderação:

- Ai, por que será? - Perguntou ela à moça do caixa, que, sem saber e/ou se importar muito, sorriu sem graça e deu de ombros.

Observei duas mulatas entrando no recinto.

- Aaaai, moça, será que é por que eu... - Aí ela retirou do bolso da jaqueta um papel que eu conheço muito bem, que sai do caixa eletrônico quando você bloqueia o cartão depois de errar a senha - Será que é por que eu bloqueei (?) ele hoje?

Mais ponderações. Decidi me meter na conversa:

- Olha, foi por isso mesmo... Já aconteceu comigo; liga nesse número que tem aí que eles desbloqueiam na hora.

Só que ela queria ligar dali mesmo e resolver o problema.

Vi as duas mulatas passando com uma garrafa de vinho em mãos.

Olhei pra trás e todas as três pessoas que estavam depois de mim, já não mais estavam.

A moça do caixa chamou uma outra umas cinco vezes pra cancelar a compra, mas a cretina parecia fingir que não estava ouvindo.

Troquei de caixa. Me posicionei atrás de um casal.

Aconteceu a mesma coisa: a anta da mulher bloqueou a senha. Os dois começaram a discutir. Mas acabaram indo lavar a roupa suja na seção dos produtos de limpeza, acho.

Vi as duas mulatas saindo do mercadinho do inferno, com suas respectivas sacolas em mãos.

Esperei a desgraçada aparecer pra cancelar a compra. Ela cancelou. Dei meu cartão pra mocinha estranha do caixa.

E pela primeira vez não errei a senha do meu cartão de alimentação.

Saí do mercado - depois de quinze minutos lá dentro - olhando uma lua mais iluminada do que o normal - no dia que especularam um eclipse que eu não consegui ver e não sei se teve. Passei diante de uma fogueira e fiquei com a minha única blusa limpa fedendo.

Cheguei no final da rua e não tinha cruz nenhuma pra me pregarem.

Essa, sim, eu não entendi...

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NOTA DO AUTOR: O título foi embasado num comentário da Letícia em outro texto meu, onde ela disse que a minha vida com a do Carneiro deixa o Via Crucis parecido com um passeio no bosque.

15/06/2011 - 21h48m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 15/06/2011
Reeditado em 15/06/2011
Código do texto: T3037342
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