O RECANTO DAS LETRAS

Por que é que tem que ser assim?

Ninguém mais sabendo de mim. Vim pela estrada que liga a capital qualquer a um dos interiores mais antigos, pensei em dois acontecimentos dignos para uma crônica. Mas foi agudo: perdi o que pensei após três ou quatro pedágios passados.

Como pode? – o escritor precisa das palavras, caro amigo, cara amiga, ou mais você que é como quiser ser chamado, e estas são as suas ideias. Mais importante que o imaginado: é a palavra que irá demonstrá-lo.

Pensei em dizer: como é bom ser Ministro de Estado e levar toda a influência para a vida privada! Decerto, não era sobre um tema tão imediato que a minha ideia fluía na estrada.

Impressões de um descaminho, talvez.

Quem sabe – eu não! – a criatividade me colocava frente a frente duas condições: fala do combustível, ordinário...! Preço alto demais! E diga também sobre os cartéis que são os postos de gasolina com seus preços milimetricamente combinados.

Não, claro que não. A ideia não tratava de valores. Teria eu que falar de concorrência, mas aí eu satisfaria demais ao leitor, à leitora, ou mais àquele que é como quiser que seja.

Daí cheguei ao Recanto das Letras, pois houve amor com a minha angústia: uma febre doida, certa dor no corpo e a necessidade de estar com as incontinências urgentes: o motorista encostou no posto, uma árvore faz sombra, e a tecnologia via modem autoriza que a internet me distraia a febre, a quase-dor e também os flancos do corpo.

Li e reli alguns textos. A maioria falava de amor. Outra parte era homenagem a Deus. Mas havia a sobra: sim, claro, literatura. A minha angústia, previamente atiçada, agora estava calminha. Como é bom ver gente se arriscando na literatura, rompendo com a banalidade dos temas, lendo, vendo, arriscando, escrevendo: gente!

Considerarei, portanto, a partir de agora, gente da minha gente (tipo angústia da mesma angústia, ou dor que não dói sozinha) aqueles que colocarem literatura no meio do que escrevem.

Nem precisa colocar de jeito, pode ser da maneira imprecisa pela qual também aprendi: enfiando de qualquer modo, mesmo!

Quando chega o dia das mães, o que devo procurar num texto de ficção? Literatura, óbvio! Homenagem às mães para que? Se o filho viver, já é a máxima honraria que uma mãe recebe. Logo vem o Natal, e a onda é a mesma: nascimento de Jesus, solidariedade. E no restante do ano... Celebramos o que?

Pois é, caro amigo, cara amiga, caro você que é como desejar... Nunca venha procurar um texto que abaixo assinarei, sob o propósito de sentir agrado. A única permissão que há para quem lê é encontrar no texto a literatura que geralmente não existe. Nunca emitiremos opiniões, mas sim, concepções.

Jamais faremos dos árabes dos outros um estereótipo daquilo que viremos a ser: essa é a nossa literatura! A única moda é falar sobre as ideias perdidas: ando nesse mundo.

Humor? Mau humor? Amor? Desamor? Esqueça a veia, cara pessoa, desmonte o tema, mero sujeito... Sabe você que exigir do autor um tema que o agrade é tal qual impor que o mundo se sacie com a combinação dos seus temperos: olha, eu detesto alho!

Prefiro assim: ninguém mais saber de mim.

Por que é que tem que ser assim? – adivinha:

- febre, gente minha, febre. Sei que se você até aqui chegou, é porque me esquecerá rapidinho.

E daí será gente minha de verdade: perceberá que o vazio deste texto está, de fato, na literatura...