A SOLIDÃO DA SALA


 
Cansada, eu...
Me deito devagar, com jeito
Empurrei a hora
O tempo que deu
Vim da sala
Sentada no sofá
A mão espalmada
No livro do Stan
Olhando a sala
Tudo morto ali
Tanto livro lido
Tudo morto
Os papeis das páginas
Das capas velhas e das novas
Enfileiradas, tudo morto
Até as prateleiras caladas
A mesa preta
Quatro lugares
De ninguém
Casa sem lares
Madeiras foram árvores
Belas ao vento, talvez
Tudo morto
Só eu vivo aqui
Só e com dores.
Vida há na varanda
Enquanto me ergo
E bebo um copo dágua,
Vive a acerola viçosa
Vive também os bulbos
Alguns brotos fortes já deram as caras,
Lembro quando eu tinha quinze anos.

Ia pela calçada de Leopoldina

E me sabia bonita
Linda pele
Jovem, perfeita e bela.
Os cabelos eram fartos
Brilhantes, e eu sabia
Com orgulho e prazer
Eu pisava as calçadas
Da Rua Cotegipe.

Eu ainda estou viva
O cabelo ralo conserva a cor
Os olhos tristes conservam o brilho
De quê?

No joelho os gelos

Cuidando da artrose
Evitando a cirurgia
Pra não perder meus joelhos.