Carinho pelo Correio.
Aquela senhora poderia ter escrito um e-mail, já que é internauta, mas não o fez.
Poderia ter telefonado, para agradecer o pequeno favor, mas preferiu escrever uma mensagem de próprio punho, num papel de seda, dobrá-lo carinhosamente, selar e remeter pelo Correio que fica há seis quarteirões do apartamento onde mora só.
O ritual de caminhar, esperar, selar e enviar a sua carta de gratidão lhe fez bem.
Voltou pra casa, mais leve – sensação de dever cumprido.
Ao chegar ao apartamento colocou um CD para ouvir. O mesmo que recebeu pelo correio e usou como fundo musical ao escreveu a carta.
O pequeno gesto que alguém fez com tanta naturalidade, enriqueceu o seu dia e embalou o seu sono.
Para quem o enviou, mandar cartinhas com mensagens e, agora CDs, não custa praticamente nada; é na realidade pura satisfação.
Imagino aquela senhora ouvindo as músicas de ninar:
“Vai haver um cineminha
Nos meus olhinhos fechados e
Nas rodas onde eu desfilo
Tem outros versos cantados
Atirei o pau no gato
No gato de papelão
Sou criança inteligente e
Tenho bom coração.”
Ou
Ao som do trombone a deliciosa marchinha:
“Marcha soldado cabeça de papel
O sargento Garcia comendo pastel
Inventou as manobras atrás do quartel...”
E o mimo que dá nome ao CD:
“Eu já vou pra cama tirar uma soneca
Hoje tem batizado de boneca...”
A autora das músicas e letras deste CD, Áurea Pinto de Miranda, autorizou que fossem feitas cópias do seu trabalho, já que o contrato com a Gravadora terminou e não houve renovação.
Todos sabem quanto custa um Cd virgem e a postagem custa o mesmo que uma carta comum.
Servir, compartilhar, proporcionar alegria sem data marcada, deveria ser natural entre os seres humanos. É uma pena que hoje, gestos assim sejam considerados raros.