Coisas da Vida V.

Ergui-me da cama num salto. Não, ainda não me transformei num “enorme inseto”, por enquanto não.

O celular me acordou. Aciono a função soneca, mas de nada adianta. Dez minutos a mais e dez minutos a menos não fazem qualquer diferença.

Uma vitamina de abacate adoçada com mel me faz reanimar. Sinto ânsia de vômito. Devo estar me apodrecendo. Meu pé direito em determinado momento da noite não me dava respostas, parecia anestesiado. Aliás, quase nada me dá respostas nesta porra de existência. Procuro a solução nos livros que nada dizem. Enquanto isso vou me enlouquecendo gradativamente, na medida possível da loucura.

O futebol jogado nas terças tem me afetado os nervos. Nos jogos se conhece bem o caráter das pessoas. Mostram-se como de fato são no dia-a-dia.

As funcionárias da coleta de lixo urbano esvaziam um décimo de uma garrafa de uísque encontrada jogada na sarjeta, e anseiam por fim poderem se jogar também na sarjeta. Mas não, varrem e varrem feito máquinas, procurando limpar a imundície do mundo cão. Ouço-os com suas vassouras desgrenhadas, a sussurrar impropérios entre uma varredela e outra. Quase sempre bêbadas e fumantes compulsivas, vivem sem expectativa alguma. Vivem, simplesmente vivem, como se tudo o mais fosse desnecessário.

A situação de minha visão me instiga a ler José Saramago. O rego de minha bunda coça inexplicavelmente há quase três meses. Não sei o que é. Minhas cuecas insistem em cair no chão do banheiro sempre que as tiro para defecar ou me banhar; parece magnetismo. Vivo numa cidade desértica dominada por plutocratas e velhas mexeriqueiras, litúrgicas, enquanto me mantenho em estado letárgico. Escrevo para não pensar muito, para que as teclas sejam minhas psicólogas. Caso contrário explodiria.

Não tenho mulher nem filhos. Na carteira R$ 1,50 me dá a esperança de ganhar na mega-sena. É tudo o que tenho.

Com o esquentar, algumas crianças saem às ruas com pipas nas mãos e cabeças ao vento. Saudosismo de minha parte.

Há caminhos a seguir, rumos ou o que quer que seja, uma vida a levar, coisas a consertar, problemas a resolver... enquanto eu, fitado por insetos invisíveis e algumas baratas mortas nos cantos, fico aqui, teclando esperanças na tela do computador, como que a computar as dores dos dias que ainda não vieram...

Cristiano Covas, 10.01.07.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 03/09/2010
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