Banco da praça
Quando se tira férias na infância fica na boca um gosto de alegria insuperável. O tempo passa mas, vez ou outra, a memória dá a sua volta inevitável ao passado de forma divertida à procura dos bons momentos. E eles aparecem fortes e claros. Decididamente! As boas lembranças fluem de forma especial principalmente quando as férias tinham como ponto de partida um apartamento – daqueles dos anos 50 – onde não existia espaço para brincadeiras, nem varandas, nem salão de festas. Era a moradia na sua forma simples e objetiva para uma família adulta e nada mais. Então levantar cedo já com as malas prontas, algumas frutas embaladas, o cheirinho do frango sendo cozido para levar de almoço... tudo isso era coisa dos deuses, mais que uma festa. E partíamos da São Paulo com destino ao interior do Paraná, onde moravam os tios e primos. A cidade era pequena, cheia da boa terra vermelha. Algumas vezes tivemos que chegar até lá de Jipe, dada a quantidade de barro quando no período de chuvas. Mas tudo era imensamente bom. Chegávamos e os abraços eram sinceros e profundos. Os tios, farmacêuticos, eram respeitados na cidade. E um dos bancos da praça da igreja levava o nome de farmácia, imponente, no seu encosto: “Farmácia São Judas Tadeu – Irmãos Sartini”. E, naqueles tempos de infância, a minha prima e eu fazíamos questão de, em meio às tardes de brincadeiras, apanhar algumas flores pequenas e colar com durex no banco da família. Pegávamos durex na farmácia, mas meu tio não gostava muito, porque durex era artigo caro na cidade. E, na mais absoluta inocência, íamos à procura de flores perfumadas pela praça. O banco ficava lindo, imponente e até maior pelo olhar infantil, num tempo em que a família era o centro do mundo. Afinal, era o banco defronte à única igreja de Araruva, atual Marilândia do Sul, onde aconteciam todos os casamentos, batizados, crismas... todos os grande eventos sociais se concentravam perto do banco. Era importante para nós destacar qualquer coisa ligada à família, naquele tempo em que o mundo era bem pequeno, cheio de sonhos e fantasias. Há dois anos, numas férias de julho, resolvemos lotar o nosso carro e fomos, triunfalmente, visitar a cidade e, logicamente, o banco. O dia estava ensolarado, convidativo. Ficamos surpresos ao perceber o quanto a cidade cresceu, com boas casas e um comércio um pouco mais atraente. Entramos na igreja e olhei os detalhes, o piso era o mesmo de quatro décadas atrás. Os bancos, as imagens... quantos sonhos passaram por ali! Quantos casamentos começaram felizes e que se desfizeram em meio ao pranto! Quantos batizados com esperança de vida longa e cheia de conquistas! Algumas vidas foram, certamente, longuíssimas, outras ficaram pelo meio, com histórias partidas em mil pedaços. Quantas orações naqueles bancos, quantos pedidos e agradecimentos! Quanta vida sonhada, pensada, sentida naquele pedaço de mundo criado à sombra de imensos cafezais! E o banco estava ali, firme, com uma grossa camada de história incrustada. Ficamos sentados ali, conversando, olhando e lembrando: meu marido, filho, irmã, sobrinha, tio e eu. Inúmeras fotos, sorrisos e saudades. Está decidido: vamos voltar a Marilândia do Sul e lavaremos o banco na primeira oportunidade. Será aquele banho agradecido, cuidadoso e cheio de afeto por um tempo que passou. Uma vida que deve ser reverenciada porque simplesmente foi vivida!