CRÔNICA SOBRE A CIDADE DE NATAL

RESISTÊNCIA À MODA?

Não me lembro muito bem o dia em que estive na Cidade Alta, mas sei que foi num fim de semana desses, literalmente num sábado. Assim sendo, fui a um encontro o qual acontecia uma vez por mês, no último sábado à tarde, no espaço cultural Bazarte (hoje extinto, porque fazia parte de mandato de vereador, o qual, já não o tem mais, graças a Deus) que ficava na rua Princesa Isabel.

Qual não foi a minha surpresa, quando cheguei ao calçadão da rua João Pessoa, no centro da Cidade Alta, deparo-me com um deserto de rua, digno de feriadão. Justamente como acontece nas grandes cidades do mundo, acima de tudo brasileira. Só que, não se tratava de nenhum feriado, era simplesmente uma rotina peculiar da minha cidade, a qual eu não estava muito a par, após passar algum tempo ausente. Estávamos em dias de trivialidades eternas de cidades movidas pelo capital, com exceção da polis natalense que apesar de rimar com ele, simplesmente não o cultua com o mesmo poder e ambição das demais metrópoles do mundo modernamente capitalista.

A Cidade Alta é um paraíso de cidade, digo isso, porque vivi dez anos em São Paulo e morei três meses no Rio de Janeiro. Todavia, se ela não entrar na onda dos “shoppings” da vida, vai terminar se transformando numa autêntica Ribeira e, dentre em breve, estarão a propagandear o novo slogan: “Revitalização da Cidade Alta”.

Afinal, pelo muito que se fez e se tem feito ou se faça pela Ribeira, afirmo que em nada mudará a cara ou a situação do centenário bairro. Que alarguem as suas ruas, que façam pavimentação ou drenem, ou construam mil pontes sobre o Potengi ligando-a à Zona Norte, ou que coloquem em cada esquina um shopping center, ainda assim ele (Bairro) jamais deixará de ser a Ribeira. Porque a Ribeira foi o que foi e só é e será o que é pelo que está nos registros, através das fotografias, dos quadros belíssimos do pintor Pedro Grilo Neto, das crônicas e das histórias contadas por Câmara Cascudo, mormente as brigas entre xareleiros e canguleiros. Aqui sim, é onde reside e irá residir a verdadeira Ribeira.

Se andar na Cidade Alta, em Natal, não se compara, nem de longe, a se andar em qualquer subúrbio de São Paulo. Eis que, por aqui, em Natal, as ruas são vazias de camelôs e as poucas gentes que transitam, caminham numa paciência interminável de Jó, e até mesmo nos horários mais críticos está longe, muitíssimo distante desta (cidade) se comparar a Bangu, subúrbio do Rio de Janeiro, insuportável de caminhar ao sábado de manhã à tarde, isto é, lá pelos idos da década de oitenta

Aqui, sábado, à tarde, é hora de se lavar as lojas e as calçadas, e de se arrumar as coisas, os troços - como dizemos nós por aqui -, onde não se vendem nem se compram absolutamente nada.

Natal se faz tão pacata, quanto o grande centro financeiro paulista, em sua avenida mais paulista de todas, em pleno período de feriadão. A Cidade Alta tem a cara da sua irmã centenária, a Ribeira; talvez, seja porque eles (bairros) ainda não aderiram à moda dos “shoppings” da vida, ou senão se achem, acredito, demasiadamente velhos para fazerem uma boa plástica, em colocarem um siliconezinho aqui, um botoxinho ali, ou, uma lipozinha acolá?

SERÃO REALMENTE OS FINS DOS TEMPOS?

*M. C. Garcia

Sabe-se que o mundo no qual vivemos desde milhões e milhões de anos que as coisas não são as mesmas coisas de sempre. Percebe-se que há um dinamismo extraordinário em tudo que vemos, vivemos ou fazemos. Vejamos o processo dinâmico que é a própria vida. Eu era criança hoje não sou mais. Vejamos o processo dinâmico que é a nossa cidade, o nosso bairro, a nossa rua. Na minha época não havia água encanada nem luz elétrica e rua calçada, nem se pensar. Por exemplo, costumo dizer que nasci em Natal, no bairro de Igapó, porém, há quarenta e sete anos atrás, esse outro lado do Rio, como costumam dizer, pertencia a São Gonçalo do Amarante (percebam que não sou quão senil assim). A nossa querida Zona Norte, para mim, era o meu lugar de aventuras onde ia para mata (capoeira) tirar ubaia, mangaba, guabiraba rasteira ou guabiraba de pau, ingá, maracujá-mochila e outras coisas mais, tudo isso frutos nativos, que talvez, só nessa crônica a(o) gentil leitor(a) esteja tendo a oportunidade de saber que aqui também, um dia, já foi um verdadeiro éden. Éden este em que o meu avô e tantos outros moradores viviam da plantação de roçados onde colhiam feijão, milho, melancia, mandioca, quiabo, maxixe, macaxeira, pipino, para suas sobrevivências. Faziam farinhada e deliciosos beijus, tapiocas e bolo de mandioca. Quem há de imaginar que onde é hoje a CAERN, no Panatis II, já foi o campo de futebol mais famoso deste lado do rio, onde se deram as disputas mais acirradas entre times famosos daquela época como Igapó F. C. e América F. C. Que a fazenda de Sr. Agnaldo é onde hoje se encontram o Hipócrates e a FAL e que onde é hoje o Nordestão era a fazenda de Sr. Nelton Bacurau. O interessante em tudo isso é que os antigos moradores de Igapó e da Redinha ainda costumam dizer que estão indo para Natal, quando vão à feira do Alecrim ou ou à Cidade Alta. Não adiantou a ponte metálica de Igapó ser trocada pela de cimento, nem tampouco, a imponente ponte Newton Navarro ser construída e o povo continuará indo a Natal. Aí sim, para essa gente são realmente os fins dos tempos.

Na realidade, estamos nos fins dos tempos e o século XXI tem nos mostrado isso explicitamente de forma extraordinariamente bela, ainda para iniciar este século vimos no Brasil a aprovação da nossa Constituição quão esperada e foi a maior festa democrática que já vivemos até então; vimos a queda do muro de Berlim, o esfacelamento da União Soviética; vemos a ascensão da China mesclada de um capitalismo-socialista; vimos um operário na Europa ser eleito presidente da sua nação; vimos um Papa quebrar toda a lógica de rei ao sair pelo mundo em nome da paz levando tiro e perdoando o agressor; vimos um país da América do Sul eleger para presidência uma mulher; vimos no Brasil outro operário ser eleito presidente e depois ser reeleito, agora vemos, pela primeira vez, na história da humanidade, o USA eleger um americano que tem parte da família na África para comandar a nação mais rica do mundo, que também já foi o primeiro senador a ser eleito.

E para se consumar os fins dos tempos realmente, o Brasil terá que se tornar uma potência, pois tem condições para isso, diante a grande crise econômica que está a incomodar o império americano nortista, ou seja, em ter que eleger no próximo pleito para a presidência uma mulher e, aqui em Natal, quem sabe, um filósofo para a Câmara Municipal. Assim sendo, estaremos realmente nos fins dos tempos RUINS, dos tempos das TEMPESTADES para vivermos o começo dos tempos BONS, dos tempos da BONANÇA. Os tempos dos arranha-céus, do shopping center, dos espaços de cultura, das bibliotecas, das lan house, do anime, do cosplay, do saneamento básico, do trabalho para todos, da solidariedade entre cristãos e não-cristãos e, acima de tudo, da consciência política aqui, desse outro lado de Natal, a nossa verdadeira NOVA NATAL e não simplesmente Zona Norte com a conotação de município, como alguns ainda insistem para que não aconteçam os fins dos tempos...

O INEXORÁVEL PROGRESSO

*M. C. Garcia

Quando nasci em Natal, Igapó ainda não tinha a dimensão que tem hoje, e mesmo sendo o bairro mais antigo da Zona Norte, depois da Redinha que já ultrapassa os 400 anos e Igapó parece não pertencer à Natal por fazer fronteira com a cidade de São Gonçalo do Amarante, onde muita gente ainda vota por lá, mesmo morando em Natal.

Natal é uma cidade que ainda não tem um milhão de habitantes e aqui desse lado já chegamos a quase 450 mil habitantes. Aqui, desse lado, o qual denomino de A NOVA NATAL, não tem rio nem mar, só fronteiras imaginárias que não impedem de fazer Natal mais Natal do que é, ou seja, extensa, muita mais extensa. Por isso, que em pouco tempo, cresceu em população, em emprego, em empreendimento, em infra-estrutura social, cultural, educacional e na saúde. E isto é muito bom para a nossa cidade. Hoje podemos contar com várias escolas públicas e particulares, vários supermercados, dois grandes hospitais, praças de lazer, quadras de esporte. Ou seja, em vinte anos crescemos, talvez, mais de cinquenta anos em relação à Velha Natal. Notoriamente, a ponte de cimento de Igapó não fez crescer tanto quanto fará a ponte Newton Navarro; é tanto que os efeitos já começaram a ocorrer antes e depois da ponte Forte x Redinha. A construção de dois shopping center, a vinda de mais três grandes lojas como Carrefour, C&A e Americanas, além das duas existentes unidades do Nordestão. Um Complexo Cultural, uma Biblioteca, um CEFET, uma Universidade Estadual, um SENAC, um SESC, várias áreas de lazer, bem como, um Ginásio Esportivo semelhante ao Machadinho. E, diga-se de passagem, vários bairros como Igapó, N. S. da Apresentação, Redinha e adjacências já foram ou estão sendo saneados. Ou seja, uma ação não muito comum nos governos anteriores, mas que agora está havendo uma exigência maior da sociedade, mormente nas reuniões do Orçamento Participativo.

Agora imaginem, leitoras minhas e leitores meus, quando daqui a mais vinte anos tivermos a ponte que dá continuidade ao viaduto do Baldo, construído a quase trinta anos atrás, quando em mim ainda aflorava os primeiros afãs de ter um emprego e fui embora para São Paulo por passar em concurso da Aeronáutica. Era justamente meados da década de oitenta do ano internacional da juventude, como eu, aos vinte e três anos de sonhos e desejos, e sequer se cogitava esse grande crescimento de Natal para essas bandas. Por isso, não se trata de ficção dizer que o Potengi, quando daqui a algumas décadas, estiver com mais três ou quatro pontes ligando o centro da Velha Natal com o centro da Nova Natal, onde se gastará não menos que quinze minutos para se ir e se vir de um lado a outro na hora que quiser. Aí, o meu saudosismo não fará nenhum questão de quando teria que andar a pé, carregado de livros, em média dois quilômetros até a ponte metálica de Igapó para pegar uma única linha de ônibus em ter que ir estudar no Instituto Municipal João XXIII, no Baldo, que hoje já não mais existe por ter cedido lugar ao imponente viaduto que liga nada a coisa nenhuma, isto é, no momento, e talvez na intenção de quem o projetou, mas que o futuro já prediz qual será a sua verdadeira função. Esperemos!

Que venha o inexorável progresso. Que venham os arranha-céus, que venham as pontes e viadutos, mas que também venham engenheiros, arquitetos, sanitaristas comprometidos com o meio ambiente. Com a causa real da nossa existência vindoura, porque de desgraça todos já sabemos e estamos cheios, em nome desses progressos capitalistas que não visam o amanhã mas, simplesmente, o imediatismos do ter aqui e agora, inescrupulosamente.

Oxalá! Que os anos vindouros sejam uma só harmonia entre capitalistas, socialistas e ambientalistas para que as futuras gerações não venham a ser extintas, porque as de hoje já pagam um preço altíssimo: poluição, câncer, asma, pneumonia e morte principalmente no trânsito.

* M. C. Garcia é poeta e filósofo.