Minha careca



Dias atrás, minha imagem foi inadvertidamente colhida numa foto. Eu não era protagonista da situação, mas sim um figurante que inocentemente compunha o ambiente sem qualquer pretensão. Ocorre que o ângulo pelo qual as lentes me flagraram contemplou o topo de minha cabeça por trás. E, então, eis que lá estava ela: minha proeminente careca, que se não representa um coco totalmente pelado, já indica uma tal devastação capilar que anuncia uma trajetória que caminha a passos largos para isso.

Sim! Como muitos, eu nasci careca, mas já tive cabelos. Quando jovem, ostentava uma cabeleira rebelde. Disso me lembro muito bem, mas confesso que nunca me entendi direito com minhas madeixas. Meus cabelos sempre foram oleosos e com uma tendência a serem ligeiramente crespos, formando volumes empenados, ondas involuntárias e outros efeitos visuais indesejáveis. Travei muitas batalhas diante do espelho empunhando escovas e pentes, cremes e géis, sem contar a infinidade de xampus e condicionadores que adquiri atraído pelas frustradas promessas de darem uma solução a tudo isso.

Porém, houve um dia em que surgiram as primeiras entradas. A testa começou a crescer para os lados e para cima. Já não havia topete que desse jeito em nada disso. E as entradas, com o passar do tempo, encontraram as saídas, além de outros atalhos vicinais que foram se formando por toda a extensão do couro cabeludo.

Houve momentos em que, também eu, cedi à tentação de pateticamente ir puxando as sobras para os lados, para trás, de esgueio, cultivando mexas premeditadamente não extirpadas e outros subterfúgios inúteis que, obviamente, foram incapazes de tapar o sol com a peneira. Acabei assumindo que nada mas havia a fazer senão aguardar com serenidade que o tampo da cabeça ficasse cada vez mais exposto.

Agora, estou eu, aqui, vislumbrando o raio da foto e admirando o avançado estágio de minha calvície. Dizem que os cabelos brancos – que já tenho em grande quantidade – dão um certo charme e, pelo que posso notar, até esse discutível predicado está me escapando pelo ralo do chuveiro a cada banho.

Não sei se poderei engrossar as fileiras daqueles que dizem que é dos carecas que elas gostam mais. Até pela natureza rebelde dos cabelos que um dia já tive, acostumei-me a dar mais destaque ao que vai dentro da cabeça do que fora o que, se nunca me garantiu nenhuma glória, ao menos jamais me constrangeu em demasia. Portanto, afora os evidentes efeitos estéticos, certamente essa careca ainda há de servir para que eu seja mais facilmente identificado na multidão.

Todavia, cá entre nós, para minha vaidade nada disso serve de consolo e, pior ainda, é que nem posso puxar os cabelos diante de tal desgosto.

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