O Cadeirante

Curitiba, dia 23 de janeiro de 2009, 19 horas. Lembro-me bem da data, pois era aniversário de minha mãe. Eu e um amigo seguíamos, dentro de um biarticulado, rumo à Igreja. Uma missa em ação de graças pela vida de minha querida progenitora estava sendo celebrada, e nós, como de costume, estávamos atrasados.

O grande ônibus, lotado, para num terminal no qual poucas pessoas desembarcam, e muitas embarcam. Em meio àquela verdadeira selva de braços, pernas e cabeças, entra um homem, que sem saber alegraria todos os churrascos e reuniões de meus amigos nos próximos meses.

O homem aparentava ter cerca de 50 anos, vestia roupas velhas e surradas. Mas o fato que mais chamava a atenção sobre sua aparência era sua perna direita amputada, que o obrigava a se locomover numa cadeira de rodas.

Como o ônibus estava abarrotado de passageiros, meu amigo cadeirante ficou com sua cadeira parada no meio do corredor, sem nenhuma segurança, já que o espaço reservado para deficientes estava ocupado. Me acometi de compaixão para com o homem, que devia ter uma vida de preconceito e sofrimento.

Decidi perguntar ao bom homem se iria demorar para desembarcar. Caso a resposta fosse afirmativa, eu pediria aos passageiros que deixassem a área das cadeiras de rodas, onde o cidadão poderia completar sua viagem com mais conforto e segurança. Entretanto, a resposta que obtive foi:

- Não te interessa!

O homem acrescentou:

- Mas como tu é gordo hein?

Nos minutos que seguiram, fui ofendido das mais diversas formas, sempre envolvendo meu excesso de peso e a minha falta de beleza física. A grosseria do sujeito me impressionava, deixava os demais passageiros perplexos, e é claro, provocava um ataque de risos em meu amigo.

Felizmente, a viagem acabava para nós na próxima estação tubo. Após conter todos os meus impulsos de proferir xingamentos e piadas de humor negro, desejei ao homem uma boa viagem, e deixei o veículo sob coros de "Bolão! Bolão!". Segui para a igreja, indignado, onde orei por aquele homem infeliz. Cheguei à conclusão de que eu fui o mártir utilizado pelo cadeirante para devolver à sociedade toda a humilhação e as ofensas que sofre.

De qualquer forma, como pude perceber mais tarde, a história ao menos renderia risos. Desde então, em toda festa ou churrasco, alguém mais fica conhecendo o "causo" do famigerado cadeirante.

Felipe de Meira Bulek

Felipão
Enviado por Felipão em 04/10/2009
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