O BEIJA FLOR E O FOGO
Não sei se sou apenas um sentimental estúpido que acredita no ser hu mano, que deposita fé no próximo, que vê em todo o mundo amor e ter
nura, que acredita que pode contagiar as pessoas se agir com solidarie
dade, respeito e consideração, ou se sou apenas um idiota manipulável
e fácil de ser enganado.
Vejo tanta coisa acontecendo ao meu redor e ainda assim acredito nas
pessoas.
Estendo minha mão, certo de que estou fazendo a coisa certa, que, que mais uma vez não vou me arrepender... Mas acontece de novo!
Depois de tantas porradas, de traições, me engano novamente e mais uma vez dou o melhor de mim, mais uma vez me comovo com o sofri
mento alheio, e novamente recebo em minha face a ingratidão, desres
peito, depois de tantas muitas vezes ainda me decepciono, ainda sinto
a alma corroer.
Gostaria de ser como algumas pessoas, que como gafanhotos se apode
ram das plantações e devoram tudo sem piedade, sem consciência, far
tam-se da boa vontade alheia como os insetos, não importando-se que
um dia a plantação irá acabar.
Apenas querem, querem, e roem e roem, sugam e sugam, e a fonte se
ca, a alma definha e o vigor se esvai e o amor se acaba, o rancor a má
goa floresce como as flores na primavera, o ódio nasce dessa florada como os frutos no outono.
A vida torna-se como os dias cinzentos do inverno, a cólera ruge no peito como trovões em um dia de tempestade, e a certeza que se apre
senta é que não veremos o próximo dia.
É como me sinto, uma plantação invadida, um rio desviado, uma fonte seca, decepcionado, frustrado por não ter resultado no que faço.
Sinto-me um palhaço, um trampolim para que alcançem as estrelas en
quanto afundo em meu eu, íntimo, amargurado com a sensação de que nada que faça vai mudar o que acontece em minha volta.
Sou apenas um beija-flor... e a floresta já pegou fogo há muito tempo.