Oi, eu sou a Kauanne!
É provável que o Senhor não me
possa ouvir orar.
Como ouvir, com tantos panos enrolados em mim?
nem reconheceria em mim um dos seus.
Tenho visto muitas pessoas após esse encontro,
pessoas bem diferentes, gente grande.
Desde quando nasci para a foto que vocês estão vendo
já mudei muito, só Ele sabe o quanto.
Algumas dessas pessoas grandes, as de branco, dizem
que preciso crescer de um jeito ou de outro.
Que sou muito pequena.
Pequena mesmo era quando me acharam!
Hoje sou grande. Muito maior do que a alma
de minha outra mãe. Se é que ela tinha alma.
Pensando bem, ela deveria ter sim. Afinal, teve a
generosidade de me permitir chegar onde cheguei.
Quero dizer, de existir. Poderia ter sido pior.
Era tão miudinha, tão coisa nenhuma,
tão sem importância que vai ver é por isso
que as pessoas de branco
querem tanto que eu cresça.
Uma dessas pessoas grandes já disse certa vez:
‘Que nunca somos do tamanho de nossa altura
mas do tamanho daquilo que nossas
vistas conseguem enxergar. ’
Fernando Pessoa, o outro.
Não sei bem o significado.
Mas da pra se ter uma ideia do tamanho da altura
da minha nova mãe. Ela conseguiu ver além dos
panos que me escondiam do resto do mundo.
Tudo poderia ter tido um final bem diferente,
um pouco mais de panos e provavelmente
eu sufocaria em silenciosa agonia sem nunca ter a
chance de saber que poderia ter até irmãs.
É possível que eu tenha uma missão qualquer
reservada neste mundo. Do contrário,
porque motivo alguém olharia para algo tão
insignificante, indefesa, sem rosto
tal qual um broto de feijão
que luta desesperadamente para emergir
ante o algodão embebido em água,
como se alguém quisesse me afogar.
Não sei ainda o que significa muita coisa,
mas quando chegar a hora de saber,
acho que vou preferir não saber.
Como os sonhos que tenho,
às vezes choro durante a noite.
Não entendo porque ela não me queria,
o que eu teria feito a ela
para ter sido esquecida em um canto
daquele hospital?
Por sorte, Deus tem enviado
alguns de seus anjos para ver o que
andam fazendo com seus filhos.
Para ver o que quase ninguém quer ver.
Meu anjo de guarda me cuida e
me salva para sempre do escuro,
da ausência da luz e do esquecimento.
Amém!
• Kakau nasceu em 30 de Dezembro de 2007
Foi rejeitada pela mãe, uma jovem de 19 anos,
E mãe de outros três filhos.
Adotada em definitivo em janeiro de 2008.
Na foto, está com 1 ano e dois meses.
Quando a vi pela primeira vez,
Estava na sala de espera para uma
Consulta médica no Hospital 9 de Julho.
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É provável que o Senhor não me
possa ouvir orar.
Como ouvir, com tantos panos enrolados em mim?
nem reconheceria em mim um dos seus.
Tenho visto muitas pessoas após esse encontro,
pessoas bem diferentes, gente grande.
Desde quando nasci para a foto que vocês estão vendo
já mudei muito, só Ele sabe o quanto.
Algumas dessas pessoas grandes, as de branco, dizem
que preciso crescer de um jeito ou de outro.
Que sou muito pequena.
Pequena mesmo era quando me acharam!
Hoje sou grande. Muito maior do que a alma
de minha outra mãe. Se é que ela tinha alma.
Pensando bem, ela deveria ter sim. Afinal, teve a
generosidade de me permitir chegar onde cheguei.
Quero dizer, de existir. Poderia ter sido pior.
Era tão miudinha, tão coisa nenhuma,
tão sem importância que vai ver é por isso
que as pessoas de branco
querem tanto que eu cresça.
Uma dessas pessoas grandes já disse certa vez:
‘Que nunca somos do tamanho de nossa altura
mas do tamanho daquilo que nossas
vistas conseguem enxergar. ’
Fernando Pessoa, o outro.
Não sei bem o significado.
Mas da pra se ter uma ideia do tamanho da altura
da minha nova mãe. Ela conseguiu ver além dos
panos que me escondiam do resto do mundo.
Tudo poderia ter tido um final bem diferente,
um pouco mais de panos e provavelmente
eu sufocaria em silenciosa agonia sem nunca ter a
chance de saber que poderia ter até irmãs.
É possível que eu tenha uma missão qualquer
reservada neste mundo. Do contrário,
porque motivo alguém olharia para algo tão
insignificante, indefesa, sem rosto
tal qual um broto de feijão
que luta desesperadamente para emergir
ante o algodão embebido em água,
como se alguém quisesse me afogar.
Não sei ainda o que significa muita coisa,
mas quando chegar a hora de saber,
acho que vou preferir não saber.
Como os sonhos que tenho,
às vezes choro durante a noite.
Não entendo porque ela não me queria,
o que eu teria feito a ela
para ter sido esquecida em um canto
daquele hospital?
Por sorte, Deus tem enviado
alguns de seus anjos para ver o que
andam fazendo com seus filhos.
Para ver o que quase ninguém quer ver.
Meu anjo de guarda me cuida e
me salva para sempre do escuro,
da ausência da luz e do esquecimento.
Amém!
• Kakau nasceu em 30 de Dezembro de 2007
Foi rejeitada pela mãe, uma jovem de 19 anos,
E mãe de outros três filhos.
Adotada em definitivo em janeiro de 2008.
Na foto, está com 1 ano e dois meses.
Quando a vi pela primeira vez,
Estava na sala de espera para uma
Consulta médica no Hospital 9 de Julho.
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