Que Susto!
Heitor e Ariadne andavam de mãos dadas. Ainda não eram nove horas de uma manhã luminosa e quente, suavizada pela brisa suave e muito fresca que sacodia as palhas dos coqueiros ao largo. Não havia viva alma à vista e os dois aproveitaram a privacidade da praia deserta para fazerem amor sobre a canga dela, estendida na areia. Permaneceram deitados ali, inebriados pela magia daquele momento tão irretocavelmente perfeito, as férias ainda no início, a feliz perspectiva de muitas manhãs como aquela à frente. Após alguns instantes dessa doce letargia, entraram na água morna e, depois, caminharam em direção ao vilarejo onde haviam deixado o carro. Era uma enseada, onde os barcos dos pescadores repousavam. Ele observou uma ponta de areia um pouco mais a frente e decidiu nadar até lá. Ela acomodou-se à sombra de uma tapera e o viu entrar na água. Admirou-lhe a musculatura bem definida, os ombros largos de nadador, o conjunto todo ainda mais atraente, sob a pele dourada de sol.
Ele mergulhou e, com algumas braçadas, avançava rapidamente na direção da península logo mais a frente.
Ela distraiu-se olhando a paisagem paradisíaca. Quando voltou a olhar para ele, apavorou-se ao ver que ele havia perdido o rumo e nadava em direção ao mar aberto. Correu até a beira da água e gritou por ele, que não deu nenhuma impressão de tê-la ouvido. Gritou novamente, com mais força e, desta vez, ele parou e olhou em volta, percebendo e corrigindo seu erro.
Porém, por mais vigorosamente que ele nadasse, não avançada, sendo, ao contrário, lançado cada vez mais para longe da praia. Ela corria pela margem, sem saber o que fazer para ajudá-lo. Via os barcos encalhados na areia, inúteis, pois sabia a dificuldade que seria tirá-los de lá. Olhando mais acima, no morro, ela vislumbrou dois vultos sentados na areia, indistinguíveis ao sol ofuscante. Gritou:
- Moço! Meu marido está se afogando!! Tem algum barco aí?
Uma voz, impúbere ainda, respondeu de lá:
- Ih! Tia... Tem que ver com os pescadores, lá na vila...
E apontou um grupo de casas, pelo menos uns trezentos metros, morro acima, o caminho de areia fofa e quente. Desanimada, sabia que nunca conseguiria chegar lá a tempo de encontrar alguém que tivesse um barco e se dispusesse a usá-lo para salvar o marido, antes que ele, exausto, se deixasse levar pela correnteza. Já se imaginava viúva e triste. Voltou a olhar para ele, em sua luta solitária contra as águas que já o haviam afastado ainda mais da segurança da praia.
Ajoelhou-se impotente, as lágrimas querendo brotar. Resistiu a elas e rezou.
Talvez os anjos tenham ouvido suas orações, talvez apenas ele tenha se cansado e parado de nadar, percebendo que, ao invés de insistir contra a maré, melhor seria usá-la para voltar. E foi o que fez. Nadando de volta ao ponto de partida, veio trazido pela correnteza até bem próximo e, em instantes, soltava-se das garras de Netuno.
Ela correu ao seu encontro e o abraçou, afoita. Ainda abraçados, ofegantes e trêmulos, caminharam até o carro.
Não disseram nada, nada havia a ser dito.
Esta seria uma história para contar aos amigos depois, às gargalhadas pelo ridículo do desespero dela na praia, do susto dele na água. Mas, naquele momento, só queriam esse contato da pele, do braço, do calor um do outro.
Imagem daqui.