O fiscal

Eram por volta do meio-dia quando um motorista entrou e sentou na minha frente. Estava injuriado de sua profissão e começou a desabafar para o companheiro do banco ao lado.

- Não agüento mais essa vida de motorista. Por dois minutos de atraso perdi dois dias de serviço – disse ele.

O camarada ao lado não estava nem aí para sua história, mas eu estava de ouvidos atentos e já pensando: isso vai dar crônica.

- O meu relógio estava dois minutos atrasados do que o do fiscal. Que culpa eu tenho isso. Fez eu assinar uma advertência e ainda por cima ganhei suspensão. Parece uma escola. Quando os chefes eram a dona Zuleide e o seu Marco nada disso acontecia. Dois dias de serviço, vê se pode uma coisa dessas.

“O pior não é isso. Na semana passada, quiseram que eu pagasse quinhentos reais de multa. Sabe o motivo? Pois é, eu também não sei. O negócio foi que logo que peguei o ônibus para embarcar os passageiros, uma senhora com uma criança sentaram nos bancos preferenciais. O que há de tanto nisso? Nada, se a criança não tivesse vomitado. Daí pronto! Aquele cheiro azedo, logo cedo, tomou conta do ônibus inteiro, e olha que estava no maior deles. Aquilo embrulhou o meu estômago e dos outros passageiros. Apesar de que não estava nem aí para o estômago deles. Não conseguia pensar em outra coisa e comecei a disputar comigo mesmo quantas paradas conseguiria agüentar. Foi uma, duas, três, quatro, cinco, cinco e meio. Não agüentei e assim que todos os passageiros desceram levei o carro para a garagem. Liguei a mangueira e lavei o bendito. Que coisa mais horrível. O que aquela criança tinha comido? Papo de urubu? Bom, o negócio foi que no outro dia quando eu voltei para pegar o mesmo ônibus o fiscal (odeio esses fiscais) chamou-me na portaria e entregou-me uma notificação. Quando fui ver era uma multa. ‘Quinhentinha’. Eles acham que é assim, fácil tirar quinhentos pau do bolso e dizer: toma. Só porque eu havia tirado o ônibus para lavar. Esses fiscais não prestam. Tudo igual. Vai dizer que não é verdade companheiro?”

O moço que estava ao lado, quase dormindo, apenas olhou de relance para ele. O motorista prosseguiu:

- Tudo uns bando de ladrão, isso sim. Você trabalha com o quê?

- Sou fiscal de ônibus.

Eduardo Costta
Enviado por Eduardo Costta em 17/12/2008
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