CAIXA DE SAPATOS (reedição)

O que seria de nosso futuro se não tivéssemos uma caixa de sapatos, para guardarmos o nosso passado?

Moro em Joinville (SC), uma cidade em que chove muito e por isso as belezas naturais são impressionantemente verdes nas brotações e esplendorosamente coloridas nas florações.

Nos domingos de chuva, em que as horas arrastam-se preguiçosamente, acostumamos o olhar através das janelas embaçadas para fora de nossas casas e para dentro de nossas vidas e nossos corações, em reparos e acertos. Inventamos receitas, escrevemos, assistimos tv, acessamos a internet, jogamos conversa fora.

Timidamente me recolho ao meu quarto na busca por um afazer, e me deparo com algo que transforma meu dia numa descoberta especial em sentido e sentimentos... uma caixa de sapatos...

Caixa de sapatos!

Que guarda meus segredos e minhas ambições.

Ficas escondida e guardada no armário quieta e esperando seu momento de fama...

De repente és lembrada e de dentro de ti vem o meu passado em forma de objetos e escritas...

Passaram-se os tempos, eu envelheci, mas continuas tão jovem como quando chegaste em minha vida.

Tu tinhas dentro de ti, meu maior desejo, um sapato novo e reluzente.

Não partiste porque percebi a tua importância...

E nesses anos todos em que me serves sem nada pedires em troca,

eu poucas novidades te acrescentei...

Uma nova repartição já gasta e um novo encarte descolorido.

Sabes de meus "casos" e não me entregas, aquelas fotos constrangedoras, aqueles e-mails impressos comprometedores, aqueles amores ocultos...

Tens o dom da conservação... meus primeiros documentos oficiais: RG, CPF, Alistamento Militar, Boletins dos colégios e as respectivas fotos agora um tanto fora de moda, os cabelos encaracolados, a calça boca-de-sino, as camisas listradas...

És um desfile ao vivo, resgatando várias modas bregas em minutos aos meus olhos...

Tem os cartões de natal inúmeros e com datas que nunca vencem, tais os sentimentos que carregam em suas mensagens e pessoas especiais que os remeteram, e que nunca mais vi em minha presença.

Aqueles botões que se desprenderam da camisa, como se desprendem algumas pessoas de nossas vidas, imperceptivelmente e somente percebemos sua falta quando as retornamos ao nosso presente.

Os extratos bancários dormentes que nos tumultuaram os dias e agora repousam em seu leito mas que às vezes retornam a noite, como se fossem conosco para a eternidade. As moedas de cinco centavos aí colocadas como se não tivessem valor por serem de pequena monta e pouco significado pessoal. Mal sabemos que nos pequenos detalhes é que sobressai o nosso caráter, e são os pequenos detalhes a moldura que Deus deu ao mundo.

E finalmente as fotos amareladas daquela viagem além da fronteira, Ciudad del Este e as companhias que pareciam ser para sempre mas que o tempo mostrou que não. Tem a foto do Rex, o cachorro bravo que mais parecia um irmão, tais os cuidados que tinha comigo e meus irmãos...

Caixa de Sapato, mesmo na imobilidade e na escuridão de um armário, mostras aos nossos corações que se tivéssemos o mesmo zelo por nossos primeiros amores, professores, pais, avós, tios e amigos, nem o tempo nos importaria diante dos que nos seguem nesta caminhada...

Robertson
Enviado por Robertson em 05/11/2008
Código do texto: T1266949