Mãe também se diverte!

Curioso como os filhos têm uma visão peculiar a respeito de mãe. Para eles parece existir: mulheres, homens e... Mãe!

Nenhum filho admite que sua mãe possa ter sentimentos iguais a qualquer mortal. Como se o fato de ser mãe a tornasse um ente diferenciado, quase amorfo.

Para filho, seja ele homem ou mulher, a mãe dos outros difere da sua. Outras mães podem ter fraquezas, mas a sua, jamais! Claro que a mãe dos outros pode ter desejos que toda mulher tem, mas a sua... Capaz!

Às vezes fico pensando como será que um filho imagina que veio ao mundo! E não me refiro as crianças, quase inocentes, já que hoje desconfio que os bebês já nasçam com alguma malícia que os prepara para adaptar-se a este mundo, tão cheio de contrastes e idiossincrasias.

O fato é que é engraçado observar o comportamento de filhos. Em sua grande maioria, independente da idade, é capaz de discutir e por vezes até brigar com sua mãe. No entanto, se alguém ousar mencionar qualquer pequenina falha, atribuída a ela, transforma-se em defensor dos fracos e oprimidos e não perdoa quem cometeu tal deslize.

Reclamam constantemente de super proteção, abominam o que chamam pegar no pé e sentem-se sempre dispostos a uma boa discussão defendendo o direito que têm de errar sozinhos. Porém, no instante seguinte, estão esperando ajuda, indispondo-se com qualquer um que possa estar “roubando” sua atenção!

Uma conhecida minha, viúva, viveu uma experiência singular.

Era seu aniversário, estava completando cinqüenta e um anos. Seus dois filhos, um casal, com idades de 25 e 23 anos, resolveram presenteá-la, deixando que escolhesse como iria comemorar esta data. Talvez um jantar num restaurante, um almoço num clube de campo, quem sabe um teatro com direito a pizza depois, enfim, muito solícitos incentivaram a mãe a escolher um passeio. Pensaram em visita ao museu, Planetário, uma tarde no Parque do Ibirapuera, encerrando com um lanche e sorvete, um passeio ao Shopping e cinema, e assim propuseram uma gama de opções que, imaginavam, agradaria a mãe.

Era uma mulher culta, que apreciava leitura e bons filmes. Executiva bem sucedida dedicava-se integralmente ao trabalho e à família. Assim, não se fez de rogada. Tão logo os filhos pararam de oferecer sugestões, decidiu-se. Queria ir a um show de Felipe Dylan.

Ao terminar de falar estava tão radiante e animada que não percebeu a expressão no rosto de seus filhos. Ambos se entreolhavam com um misto de espanto e preocupação, talvez duvidando de sua sanidade. Prontamente tentaram fazer a mãe mudar de idéia lançando mão de todos os argumentos que podiam se lembrar, para mostrar que era uma péssima escolha.

Mas o sorriso e a expressão de alegria, acabaram convencendo os filhos, de que era realmente o desejo da mãe. Ainda tentaram convencê-la a trocar por uma apresentação da sinfônica no teatro Municipal ou pela peça teatral de Shespeare, que estava sendo encenada por um elenco formidável.

Porém, nada demoveu a mãe de sua escolha primeira. Agradecia, toda gentil aos oferecimentos, mas insistia em não trocar.

Assim, foram eles assistir ao show. Manifestavam claramente, certo desconforto pela escolha da mãe, que se misturava tranquilamente entre a multidão de jovens, num aperto desagradável e cansativo.

No entanto, nada parecia aborrecer aquela senhora, risonha e entusiasmada, talvez ate mais que muitas de dezoito anos, que ali estavam.

A idade predominante era de 15 a 20 anos. O que incomodava, sobremaneira, seus filhos, que se sentiam constrangidos pela presença da mãe num ambiente, que para eles, era inadequado.

Logo o show começou. Estavam sentados num lugar relativamente bom, embora a agitação da moçada impedisse de se ter uma visão melhor. A mãe muito a vontade pediu uma coca cola e pipoca.

Como se não esgotasse o repertório de surpresas em relação ao comportamento da mãe, foram os dois muito solícitos atender ao seu pedido.

Deixaram as cadeiras reservadas e lá se foram. Até que chegassem ao destino e conseguissem retornar, o show já ia longe. Não se importavam nenhum pouco, pois tudo que desejavam é que acabasse logo de uma vez.

Ao voltarem, nova surpresa. Seus lugares encontravam-se ainda guardados, mas no lugar da mãe estava um jovem, bem apessoado esparramado e cochilando.

Mais que depressa o tiraram da cadeira e despejaram uma série de perguntas misturadas com acusações sem dar tempo ao pobre rapaz de responder nenhuma.

Foi quando o filho parou de falar, os olhos fixos em algum ponto longe dali. Sua irmã, ao perceber esta reação acompanhou seu olhar e precisou se controlar para não gritar.

Lá, em frente ao palco, onde um grupo de jovens dançava próximo ao cantor, estava sua mãe. Sorrindo, cantando e disputando espaço de igual para igual com a moçada. O primeiro impulso de ambos foi correr até lá e arrastar a mãe para bem longe. No entanto, algo em seu olhar, no sorriso farto e quase inocente, tocou o coração de ambos.

Aos poucos se acalmaram, e foram lentamente se aproximando da mãe. Não havia como enganar-se, há muito não viam a mãe tão feliz. Acompanhava o ritmo da música sentindo a energia que pairava pelo ar.

Naquela noite, quando retornaram para casa e a mãe se recolheu, não parando de agradecer o presente, ambos ficaram conversando por longo tempo. Admitiram que ela era como eles, sentia prazer em coisas simples também; que conservava no coração o mesmo entusiasmo que tinha quando jovem. E era muito bom pensar que um dia eles surpreenderiam seus próprios filhos.

Priscila de Loureiro Coelho
Enviado por Priscila de Loureiro Coelho em 12/03/2006
Código do texto: T121983