O AZARADO !?!

Claudionor não se conformava em ser azarado.

A começar do nome que ele odiava.

Filho da Claudenice e do Norival.

Nonô gostava de apostar em tudo e gastava toda sua mesada em rifas, quem acabaria a lição primeiro, quem tiraria a melhor (e a pior) nota da classe.

Não ganhava nunca.

Jurava que era “praga de uma velha beata” numa festa junina da igreja.

Por causa de uma rifa de frango assado.

Na verdade, ele nem sabia do que era a rifa. Passava na barraca e estavam naquela de comprem o último número.

Ele comprou.

E ganhou um frango assado.

Diz ele que a senhora fitou-o mortiferamente e disse: ”Que garoto de sorte!”

Daí para frente sua sorte claudicou.

A começar pelo frango que estava frio e cheio de óleo, que derramou na camisa de festa e lhe valeu umas palmadas da dona Nice. Além do que, o frango devia ser manco porque ele só achou uma perna.

Foi crescendo com a sorte lhe dando mancadas.

Era o capitão do time de futebol da rua e foi retirado da função porque não ganhava um par ou ímpar.

Olhem que ele treinava em casa.

Mão direita contra mão esquerda.

E perdia.

No cara ou coroa se a moedinha tivesse duas caras caía em pé, mas nada do Nonô ganhar qualquer coisa.

Na tômbola, só era o primeiro a fazer a “cinqüina” quando ganhava quem enchesse a cartela e sempre ficava na “boa”.

Chegando a adolescência, por diversos motivos mudou de apelido.

Nonô era apelido de criança ou de velho caipira. Não ficava bem.

Consultou a numerologia e pronto.

Dinho.

A adolescência muda um pouco o gosto dos garotos.

Dinho começou a descobrir as meninas.

E apostar com os outros adolescentes quantas iria namorar, beijar, enfim...

No começo parecia que a sorte estava mudando, até que as moçoilas ficantes descobriram que toda aquela paixão desenfreada dos rapazes era quase só aposta.

Os adolescentes do pedaço tiveram que granjear seu papo em outra freguesia.

Nem quando o Dinho se apaixonava perdidamente dava certo.

Como nunca se apaixonava por apenas uma de cada vez, acabava perdendo as duas.

Finalmente, depois de alguns anos conseguiu ganhar um bolão.

Copa do Mundo.

Braziu e França.

Distraído, anotou três a zero na folha de papel almaço, sem olhar as colunas.

Ganhou sozinho.

França três a zero. Final da Copa de 1998.

Recebeu o dinheiro dos amigos que ficaram de cara fechada com ele um bom tempo.

Traidor, do contra, apátrida, néo-capitalista foram alguns dos nomes que lhe disseram.

Nem explicando que era normal o Braziu perder da França em Copas do Mundo e Olimpíadas serviu de argumento.

Um pouco de história.

A única vitória canarinha contra a França em Copas do Mundo foi em 1958 por cinco a dois, mas a França jogou com dez jogadores desde os trinta minutos do primeiro tempo, quando um de seus principais jogadores, Jonquet, quebrou a perna e não podia ser substituído. O jogo estava um a um.

De qualquer maneira, Dinho era proibido de participar de apostas de jogos do Braziu e muito menos assistir os jogos no telão do bar.

O Sr. Cláudio, seu nome de adulto, nunca se casou.

A fama de apostador inveterado, e ainda por cima azarado, espantava eventuais candidatas.

Diziam que nem o ditado “azar no jogo, sorte no amor” cabia para ele.

Sei lá se tinham razão nisso.

Nunca teve que acordar de madrugada com choro de criança, trocar fraldas, almoçar na casa da sogra, aturar TPM, escutar que ganhava pouco, que o vizinho tinha um carro mais novo, pagar pensão alimentícia.

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Pedro Galuchi
Enviado por Pedro Galuchi em 05/06/2008
Reeditado em 05/06/2008
Código do texto: T1020890
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