O Griguilim e a Sabiá

Ao meu amigo Tiringa,

Homem de muita coragem;

Em sua plena homenagem,

Lembro-me da Caatinga;

Eu escrevo nessa ginga

Que é para deixar de herdade

Sua prosa da verdade,

A tradição do caipira,

Não "verdadeira mentira",

Pois você tem liberdade.

Charlles, Tiringa, Lopim,

Mais outros numa resenha,

Ao pé do fogão a lenha,

Contavam prosas sem fim.

Começou Lopim, enfim,

A narrar o fato pleno;

E, com seu jeito sereno,

O conto que lhe ocorreu,

Da maneira que aprendeu,

Disse mirando o terreno.

Era o causo de um banquete

Que ele certa vez comeu.

Foi incrível o que se deu:

Não acerta sem macete.

Sentado no tamborete,

Lopim disse em fala amena:

“Foi um griguilim apena.

Trinta pessoas comeram;

Da sobra, cinco roeram”,

Enquanto ria da cena.

Tiringa ali bem pacato,

Tomando um café com pão,

Disse: “Lopim tem razão.

Eu tenho um exemplo exato,

Que é pra confirmar o fato.

Ocorreu que, certo dia,

Do mato vovô trazia

Muita carne para nós;

Lá do terreiro, veloz,

Disse: 'inté, pança vazia!’”.

Logo que se aproximou,

Tiringa entendeu o que era.

Ali, naquela tapera,

Bem ligeiro arrodeou.

Veio a trupe e se voltou

Para saber o que tinha

De especial na cozinha

E logo eles se admiraram.

Todos os pratos pegaram

E a cumbuca de farinha.

A boia tirou da estiga

E encheu a pança do povo;

Desde o senil ao mais novo,

Fastiaram a barriga.

A toda a gente, sem briga,

No almoço partiu o maná;

Vovô disse: “e a quem chegá

Pode oferecer sem pena,

Pois nós comemos apena

A banda da sabiá”.

Dezenove, antes, paparam,

Mas sobrou um bom bocado

E à tarde, tangendo gado,

Seis tropeiros se achegaram.

Por comida perguntaram

E a mãe do Negão foi lá.

“Se aprocheguem para cá.

Podem comer sem ter pena,

Pois nós comemos apena

A banda da sabiá”.

Glosas em heptassílabo.

Daniel Lira
Enviado por Daniel Lira em 17/10/2023
Reeditado em 17/10/2023
Código do texto: T7911059
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