Sina do errante (Tributo a João Cabral de Melo Neto)
Siga firme, retirante
Fugindo da seca braba
Que terras de Caatinga
Consomem tua pouca baba
Marche por Capibaribe
Quiçá, o Paraíso exibe
No mar, Pernambuco acaba
Serão léguas de distância
Em terras de Juazeiro
De Aroeira e Mandacaru
Bioma puro brasileiro
Como mostrou João Cabral
Em tua obra visceral
É por tua conta, parceiro!
Adiante foragido
Já que é esta tua escolha
Morte está sempre à espreita
A teu redor, mata sem folha
Assim como teus iguais
Por conflitos sociais
Caíram por minha fé caolha
Muitas léguas de distância
Dominadas por serpentes
Com sorte um magro gambá
Fazer-te lamber os dentes
Água escassa vai te judiar
Meia volta vai lamentar
Aqui é terra de Sol candente!
Passe bem longe, errante
Se encontrar gleba cercada
Severino de Maria
Já deixou a nação avisada
Vai conhecer Morte mais cedo
Se avançar a grade sem medo
Aos vinte, vida abreviada
Siga as léguas de distância
Até chegar em Zona da Mata
Chafurde no manguezal
Peça esmola a um de gravata
Acreditou no Paraíso
É Recife, pra teu juízo
Não seja pessoa ingrata!
Agora quieto, forasteiro
E implore um subemprego
Nem seca, nem coronel
O fizeram pedir arrego
Em palafitas terá vaga
Sou Latifúndio, tua chaga
A favela é teu aconchego
Não há mais léguas distantes
Preso está à grande cidade
Ganhaste uma sobrevida
No rol da mortalidade
Se não levantar a voz
Que incomode o Estado algoz
Talvez chegue a meia idade!