CORDEL DO CASÓRIO
CORDEL DO CASÓRIO
Num velho banco da praça
De braços entrelaçados
Olhos cheios de desejos
E corpos incendiados
Prometeram amor eterno
Do jeito mais lindo e terno
Dois jovens apaixonados
Dentre as juras proferidas
Naquele gostoso momento
Uma delas se referia
Ao tão honroso sacramento
Que faz até homem chorar
Acontece aos pés do altar
E é chamado de casamento
Foi com os olhos cheios d´água
Que o moço fez o pedido
A moça sentiu-se honrada
Em tê-lo como marido
Teve palpitação e insônia
Pensando na cerimônia
E na beleza do seu vestido
O cabra voltou para casa
Pensando na decisão
E a primeira providência
Foi falar com o seu patrão
Para conseguir um aumento
Que garantisse o sustento
E bancasse a celebração
A segunda providência
Com relação ao casório
Foi ajuntar os documentos
Para levar ao cartório
E com todas a galhardias
Esperar os trinta dias
Do trâmite obrigatório
A mocinha sonhadora
Imaginando uma vida bela
Não parava de pensar
Em seu dia de cinderela
Nada teria defeito
E tudo sairia perfeito
De acordo com os planos dela
O moço estava feliz
Por ter conseguido o aumento
Já tinha até definido
Uma data pro casamento
Só faltava o terno preto
Para cobrir o esqueleto
Na hora do juramento
E finalmente chegou o dia
De realizar os combinados
A igreja estava repleta
De elegantes convidados
Os pais e os padrinhos
Os amigos e os vizinhos
Já estavam posicionados
Com a marcha nupcial
A noiva foi adentrando
O rapaz muito ansioso
Ficou com olhos brilhando
Será que estava a sonhar?
Mal podia acreditar
Que já estava se amarrando
A princesa encantada
Não conteve a emoção
Já com os olhos embaçados
E um aperto no coração
Sentiu que os pés flutuavam
E parecia que andavam
Em nuvens de algodão
Realizou-se o casamento
E veio a doce lua de mel
Mas passado esse momento
Da viagem até o céu
Chegou o penoso dia
De suportar a agonia
E provar o amargo do fel
Depois do primeiro filho
A rotina ficou apertada
A moça não se arrumava
E não tinha tempo pra nada
Vivia sempre queixosa
Com uma relação amorosa
Que já estava desmoronada
Aquela que fora um dia
Um anjo de amor e candura
Nas rusgas do dia a dia
Foi perdendo a compostura
E ele que era pacato
Foi ficando grosso e chato
Uma rude caricatura
E com tanto bate-boca
O amor estraçalhou
O moço ficou nervoso
A moça não o suportou
Foi atrás do advogado
O juiz foi acionado
E o casório fragmentou
A gatinha tão querida
Virou uma vaca encrenqueira
Chamou de cachorro o mocinho
E o cachorro perdeu a estribeira
Quando a sogra entrou no meio
Aí foi que o trem ficou feio!
Deu barraco e deu bebedeira
A audiência foi marcada
Pra acabar com a desavença
O meritíssimo até tentou
Reacender a benquerença
Mas já que não houve jeito
O trato ficou desfeito
Mediante a sua sentença
A moça ficou com a casa
Garantindo também a pensão
O moço ficou com uma calça
E com as contas do seu cartão
E para afogar a tristeza
Vagueia de meia em mesa
A base de pinga e limão
Os enlaces de hoje em dia
São contratos provisórios
Que começam e que terminam
Com as canetas dos cartórios
Mas se o povo quer amar
Vale a pena acreditar
Que venham outros casórios!
Autora: Márcia Haidê