AS PERGUNTAS IDIOTAS E AS RESPOSTAS DE SEU LUNGA PARTE 3

Já escrevi dois cordéis

Falando do velho Lunga

Pessoa de bom conceito

Porém muito ele resmunga.

Se lhe aparece um janota

E faz pergunta idiota

Fica de sujar a sunga.

O problema de Seu Lunga

É que o velho não gosta

De perguntas idiotas

E nisso a moçada aposta

Mas o velho tem na "cesta"

Pra cada pergunta besta

Intolerante resposta.

Se ele gosta, se não gosta

Essa verdade eu não nego

Com tanta pergunta boba

O velho perde o sossego

E incha até o pescoço,

Porque Seu Lunga é mais grosso

Que papel de enrolar prego.

Sempre comigo carrego

Caneta para escrever

E um bloco de papel

Com a intenção de colher

De Seu Lunga algum rompante

E sempre uma importante

Alguém tem pra me dizer.

Um dia ao anoitecer

O velho teve uma surpresa

Ao perguntar pela janta

A sua esposa Tereza

A velha inocentemente

Lhe respondeu num repente:

"A sopa já tá na mesa."

O velho, por natureza,

Já foi dando uma patada

E com sua intolerância

Respondeu pra sua amada:

"Não seja burra, Tereza,

Não bote a sopa na mesa,

Bote no prato, abestada!"

Numa tarde ensolarada

Seu Lunga estava pescando

Ao por no anzol a minhoca

Um sujeito ia passando

Ao vê-lo se aproximou

Com malícia perguntou:

"Lunga, você tá pescando?"

O velho foi resmungando:

"Mas que dia de azar!"

Com sua brutalidade

Pro cabra só fez bradar

Rancoroso e resmungando:

"Não, eu estou ensinando

Essa minhoca a nadar!"

Lunga acabou de comprar

Um buquê com várias cores

De rosas pra sua santa

Nossa Senhora das Dores

Sua esposa exclamou

E ainda lhe perguntou:

"Meu velho, isso são flores?"

Ele disse: - Oh, meus amores!

Assim eu me desconcentro

Abestada, num tás vendo

Que isso é alface e coentro?»

Aí começou comê-las

Com raiva, já vendo estrelas,

Botando tudo pra dentro.

Um dia, andando no centro

Da cidade, descuidado,

Caiu um grande toró

E o velho muito enfezado

Com São Pedro reclamando

Pra casa saiu bufando

Chegando todo encharcado.

Seu Lunga tava molhado

Até por dentro da luva

Chegando em casa encharcado.

Querendo ficar viúva

Sua esposa exclamou

Ou melhor, lhe perguntou:

"Tudo isso foi a chuva?"

Mas feroz do que saúva

Na queimada do capim

Pensou: "Essa velha quer

Ainda hoje levar fim!

- Porém respondeu - Foi não,

Passou uma multidão

Cuspindo em cima de mim!"

O velho Lunga é assim,

Pior que um sacripanta

Está sempre enfezado

Com tanta pergunta, tanta

Que até perde a noção,

Com qualquer indagação

O velhote já se espanta.

Um dia, à hora da janta,

À mesa foi se sentar

Sua esposa perguntou:

- Meu velhinho quer jantar?

Lunga inverteu a colher

E respondeu: - Não, mulher,

Eu quero jogar bilhar!

Uns óculos foi comprar

Pras bandas de Limoeiro

Perguntou-lhe a vendedora:

- Qual é dessas, companheiro?

É pra longe ou pra perto?

Lunga respondeu esperto:

- É pra ir pro Juazeiro.

Sorrindo com o entrevero

Fez de novo a atendente

A pergunta e lhe falou:

- Estou falando é da lente»

Seu Lunga dando a biloura

Respondeu pra vendedora:

- Eu quero as duas na frente,

Sentindo uma dor potente

Foi ao posto da cidade

Mostra a perna à doutora

Na maior tranquilidade

E a doutora examinando

Para o velho foi falando,

- Seu Lunga, isso é da idade!

Seu Lunga disse, - Beldade,

Não venha com ladainha!

E botou a outra perna

Em cima da escrivaninha

Dizendo, - Olhe pra essa,

É da mesma idade dessa

E ela está boazinha!

Lunga andava na pracinha

Com um rapazola de lado

Quando o relógio do moço

Caiu e ele admirado

Falou pra Lunga que ouviu:

- O meu relógio caiu

E ele está ali parado,»

Lunga bastante enfezado

Fita o moço a resmungar

Perguntando com ironia

Pra seu amigo escutar:

- Ora, monstro das cavernas,

Por acaso, ele tem pernas

Pra dali se levantar?

Seu Lunga foi trabalhar

Quando o sol ia saindo

Ao abrir o armazém

Alguém perguntou sorrindo

Ao velho rei da resmunga:

- Bom dia, meu caro Lunga,

A loja já está abrindo?

Em ira se esvaindo

Como sempre resmungando

Olhando para o sujeito

A porta ele foi baixando

Chega a poeira voou

Mas antes ele bradou:

- Não, eu já estou fechando!

Certa feita viajando

Pra um centro em Canindé

Foi consultar-se com um médium

Adivinho e nessa fé

Lunga bateu no portão

Quando ouviu o adivinhão

Perguntando assim: - Quem é?

Lunga, já perdendo a fé

Pensou, - Aqui eu não entro.

Porém antes dele ir

Embora daquele centro

Respondeu lá do portão:

- Cê não é adivinhão?

Adivinhe aí de dentro!

Lunga foi jantar no centro

Com a esposa num restaurante

O garçom veio atendê-lo

Rapidinho, num instante,

Fitando o velho resmunga:

- É sua esposa, Seu Lunga?

Perguntou-lhe o intratante.

Lunga num grande rompante

Dando a gota e a bixiga

Aberturando o garçom

Já querendo comprar briga

Respondeu todo exaltado:

- Num é não, seu abestado,

Essa é minha rapariga!

O milharal do intriga

Já estava bonecando

Lunga foi limpar o mato

E quando estava limpando

Sua plantação de milho

Pergunta-lhe assim o filho:

- Papai, está capinando?

Para o filho o velho olhando

Já foi lhe dizendo, - Nossa!

Parando de capinar

Como ele é casca grossa

Respondeu assim pro filho,

- Não, tou arrancando o milho!

E meteu o pau na roça.»

Com uma tinta bem grossa

Foi pintar o armazém

Quando chegou um freguês

Vendo Lunga sem ninguém

Com tinta, rolo e pincel

Foi exclamando o incréu:

-Tá pintando a loja, em!

Lunga exclamou também:

- Valei-me, meu São Tomé!

Aí parou de pintar

E bruto como ele é

Meteu o pincel na boca

E disse: - Cabeça oca,

Tou chupando picolé!»

Lunga tomava café

Bem quente no seu banquinho

Sentado no seu quintal

Quando pergunta um vizinho

Do outro lado de lá:

- Seu Lunga, o senhor está

Tomando o seu cafezinho?

- Que nada, meu bom vizinho!

O ranzinza respondeu

- Eu estou tomando banho!

Aí se enfureceu

Derramou todo café

Da cabeça até o pé

Que o quengo chega ferveu,

Certa vez aconteceu

Dentro de um avião

Em que Seu Lunga viajava

Ele ouviu um cidadão

Dizendo num arrepio:

- Nunca andarei de navio

Pois nadar eu num sei não.

Na minha opinião

O Navio pode afundar...

Nessa altura o velho Lunga

Pro cabra só fez virar

Perguntando o resmungão:

- Então andas de avião

Porque tu sabes voar?

Querendo leite tomar

Gritou, - Tereza, me dê

Um pouco de leite quente!

Ela deixando o crochê

Depressa se levantou

E pra Lunga perguntou:

- Meu amor, eu trago em que?

Com esse seu proceder

O tal velho resmungão

Respondeu estuporado:

- Derrame o leite no chão

Venha daí com denodo

Empurrando com o rodo,

Corra, não demore não!

Lunga comprou um garrafão

De leite lá em seu Dunga

Chegando em casa a mulher

Dele pergunta e resmunga:

- Parece que doido sois,

Se aqui só tem nós dois,

Pra que tanto leite, Lunga?»

Pra responder o resmunga

Jogou o leite no chão

Bufando feito um boi bravo

Com a vassoura na mão:

- Velha doida, abestalhada,

É pra lavar a calçada!

E traga logo o sabão!

Certa vez um cidadão

No armazém foi chegando

Para comprar uma bomba

E foi logo perguntando:

- Tem certeza, camarada

Que essa bomba enferrujada

Está mesmo funcionando?

Lunga falou reclamando:

- Ela está enferrujada

Mas essa sua pergunta

Até parece piada

- E acrescentou fervendo

- Amigo, tu num tá vendo

Que ela tá desligada?

Outra vez numa calçada

Seu Lunga escorregou

Caindo ficou sem fala

Um rapaz o ajudou

Pois ficou com pena dele.

- Dê um pouco d’água a ele!

Uma mocinha exclamou.

O velho se levantou

E disse mal humorado,

- Eu caí, não comi doce,

Deixe de papo furado!

Quer curtir a sua mágoa?

Pegue lá seu copo d’água

Leve pro seu namorado!»

Seu Lunga estava sentado

Irado como ele é

Um cabra chegou pra ele

No velho botando fé

Com um tom bem camarada

Lhe perguntou: - Essa estrada,

Ela vai pra Canindé?»

O velho ficou de pé

Irado disse ligeiro:

- Ela nunca se arrancou

Pra sair sem paradeiro

Mas lhe digo, seu peralta,

Se ela for vai fazer falta

Ao povo de Juazeiro

Seu Lunga é bem presepeiro

Bastante mal-humorado

Mas é muito gente boa

Se o tratam bem tratado.

Tem uma vida pacata

Essa é sua história exata

E o cordel tá terminado,

Belém, 02 de maio de 2014

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 06/12/2016
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