3ª idade - Cara & Coroa

Duas amigas muito queridas

Discutiam e discordavam

Ao tempo em que relatavam

O rumo de suas vidas

Apesar de tão unidas

Pensavam tão diferentes

Uma era descontente

A outra feliz da vida

A primeira reclamava

De sua saúde e da idade

E com muita propriedade

Desse jeito assim falava:

Qual é a perspectiva

De quem velho já se sente

Sendo hoje dependente

Mas que outrora fora ativa?

Dizer que a melhor idade

É a depois dos sessenta

É coisa que o povo inventa

Para encobrir a verdade

Isso é melhor idade?

Sinceramente me diga?

Só se for para a fadiga

E pras casas de caridade

A melhor idade seria

A idade da infância

Pois quando se é criança

Tudo são festa e alegria

Por isso passa ligeiro

Por ser descanso e lazer

É brincar e aprender

Esse é um tempo fagueiro

É na fase pueril

Que o mundo é bonito

É fantasia, festa e agito

Viva a idade infantil!

Mas, quando se é idoso

Só restam as recordações

Dos prazeres e emoções

De um tempo ido e saudoso

Sentindo o lombo cansado

Depois de tantos janeiros

Para avaliar o corpo inteiro

Fiz exames variados

Bem na era digital

Nos tempos da informática

Adquiro coisa arcaica

O quê seria afinal?

Os estragos e os riscos

O médico avaliou

E calmamente informou

Que eu tinha hérnia de disco

Disco é coisa ultrapassada!

Cd seria bem menor

Um pen drive era melhor

Talvez nem sentisse nada.

Mas, além dessas lesões

Tenho artrose e arbitre

Tenho também tendinite

Afetando meus tendões

Virei dona de pedreira

Na vesícula biliar

Que para me operar

Quase usaram britadeira

Tenho o fígado besuntado

Estou com pouca audição

Enfisema num pulmão

E o pâncreas avariado

Tenho cistos nos ovários

Já fiz histerectomia

Tenho gastrite, sinto azia

E tenho nódulos mamários

Tenho as veias entupidas

Hipertensão arterial

Insuficiência renal

E um soluço incontido

Tenho a vista cansada

E uma dor que aperta o peito

Pra completar os defeitos

Tenho a boca desdentada!

A segunda assim dizia:

Tudo é muito relativo

Não vejo nenhum motivo

Para tamanha arrelia

Quando criança sonhava

Tinha as minhas fantasias

Toda hora e todo dia

Nada me preocupava

O tempo passou, cresci

Amei muito e fui amada

Um casamento abençoado

E lindos filhos eu pari

Para ser independente

Estudei, fui trabalhar

Tenho histórias pra contar

As quais recordo contente

Tenho minhas limitações

Advindas com a idade

Isso é fato, é bem verdade

Mas não nutro aflições

Lamentar é muito chato

E pra não viver em conflito

Transformo o feio em bonito

Adaptando-me aos fatos

Não sou velha sou idosa

Velho é o que já prescreveu

Quem embora vivo, já morreu

Eu ainda sou valiosa

Da minha saúde cuidei

E hoje vivo sossegada

Na vida de aposentada

Colhendo o que plantei.

Iranil J Azevedo
Enviado por Iranil J Azevedo em 01/10/2014
Reeditado em 01/10/2014
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