PRESSÁGIO NO SERTÃO

PRESSÁGIO NO SERTÃO

Silva Filho

No meu sítio Tabulêro

Na mia famía são cuatro

E a gente óia pro prato

Sem inxergá nem tempêro.

Fico oiano no terrêro

As nuves em convulsão

Chegano perto do chão

É qual a bala perdida

Sem a chuva num tem vida

Sem vida num tem sertão.

Só vêjo mêrmo o mormaço

Qui fáiz pensá côiza bôa

Cum meus fio e a patrôa

Vivo só marcano passo.

Pra cumê, um bicho caço

Inquanto num tem truvão

Oiano os calo nas mão

Só calo, sem ter cumida

Sem a chuva num tem vida

Sem vida num tem sertão.

E o tempo vai passano

Sem água pra nossa roça

Sem corrente qui impoça

Quando entra o nôvo ano.

Meus cumpade tá pensano

Qui num vâmu ter feijão

Qui póde morrê sem pão

Tôda essa gente quirida

Sem a chuva num tem vida

Sem vida num tem sertão.

Tem muita gente pidindo

Pra São Pêdo se alembrá

Dos pôvo que veve cá

E de fome tá sumindo.

Vêjo as criança sorrindo

Cum rôsto côr de carvão

Sem sabê do sim ou não

Sôbre a nossa dispidida

Sem a chuva num tem vida

Sem vida num tem sertão.

Fui falá cum sêu dotô

Sôbre esse farso mormaço

Disse o dotô: – até março

Vai sorri quem esperô.

Quem isperança guardô

Quem agiu cuma cristão

Quem rezô, fêiz oração

Quem de Deus nunca duvida

Vai ter chuva e vai ter vida

Muita vida no sertão.