A CONFUSÃO DO LEITE NO MOSQUITO
Antônio Lampião
Para fazer um romance
Peço que Deus me dê ritmo
No dia treze de agosto
Fazia um dia bonito
Quando a tarde chegou
Uma carreta virou
Na Chapada do mosquito
As cinco horas da tarde
Foi que a noticia bradou
Por um outro carreteiro
Que pelo local passou
Como quem para e descansa
Disse: na Boa Esperança
Uma carreta virou
O povo então assustado
Perguntaram o que é?
Diga o que vinha dentro
Era milho seu José?
O que pude observar
Posso a vocês afirmar
Que é leite Itambé
Foi aí que o pessoal
Começou a se ajuntar
Gente velha, gente nova
Gente de todo lugar
Para o que der e vier
Na carreta de Itambé
Todos queriam chegar
E naquela correria
Era um grande labacé
Gente de carro, de moto
De bicicleta e a pé
E com bastante alegria
Uns para os outros diziam
Vamos buscar Itambé
E ao chegar no local
A cena foi incomum
Gente por cima, por baixo
Era aquele zum zum zum
Homem, menino, mulher
Pra colher leite Itambé
Cada um é cada um
Todos trabalhando duro
Diziam assim, ora bem
Uma noite como esta
Faz tempo que aqui não tem
Se o contrário não vier
Vamos beber Itambé
Até o ano que vem
No meio disso tem gente
Que não sabe o que diz
Agora com esta safra
Eu empinei meu nariz
Agora se Deus quiser
Vendo o leite Itambé
E compro a minha Bis
Na grande empolgação
Gente até sente orgulho
De uma certa distancia
Dava pra ouvir o barulho
Diziam: ou trem esquisito
Agora aqui no Mosquito
Itambé vai dar gorgulho
Na manhã do outro dia
Começou o sururu
Gente oferecendo leite
Desse do pacote azul
Sem querer exagerar
Chego até comparar
Com a Feira de Caruaru
Uns compravam, outros vendiam
Preço fraco pra dedeu
Negócio bom como este
Foi derramado do céu
Era tão pouca a merreca
Se alí tivesse um poeta
Tinha formado um cordel
Por volta do meio dia
A confusão começou
Virou um deus-nos-acuda
Quando a polícia chegou
A população correndo
Uns para os outros dizendo:
Agora o “baraio dobrou”
Por que alegria de pobre
Logo vai para o buraco
Quando Deus dá a farinha
O Diabo vem rasga o saco
E durante a operação
Quem bancou o valentão
Foi preso por desacato.
Daí por diante a polícia
Começou arrecadar
Tinha Itambé escondido
Em quase todo o lugar
Era “os homens” procurando
Dois estivas esperando
A ordem para carregar
Muitos falavam em cochicho
“Tá aí os homens de bota”
Outros de cabeça baixa
Reconhecendo a derrota
Veja só como é que é
Foi encontrado Itambé
Enterrado na bolota
Foi encontrado Itambé
Por toda a região
Nova Iorque, Pastos Bons
São Domingos do Azeitão
Santa Fé e Mirador
Cocos, Balsas, aproximou
E comprou itambezão
Voltando atrás um pouquinho
Eu esqueci de narrar
A maioria dizendo
Nóis não vai mais trabalhaiá
No decorrer deste ano
Vamos ficar esperando
Outra carreta virar
Itambé lá no Mosquito
Até perdeu o valor
Tinha Itambé para o filho
Para o pai e o avô
Pra quem vem e pra quem vai
Pra quem chega e pra quem sai
Tinha Itambé sim senhor.
Mas essa grande alegria
Por pouco tempo durou
Porque os homens da lei
No local se abarracou
Foi assim que aconteceu
Informando quem vendeu
Tomando de quem comprou
O trabalho da polícia
Fez gosto a gente ver
Fazendo tudo direito
Sob os conformes da “ler’
Fazendo sua função
Sem ter discriminação
Que é assim que deve ser
Por isso caro leitor
Ouça essa e pense bem
Não queira subir na vida
Com o suor de ninguém
Claro, você vai gostar
Mas quando menos esperar
Aí o castigo vem.
Por isso meus bons amigos
Não entrem em desespero
O que aconteceu de fato
Vocês não são os primeiros
Eu posso até afirmar
Vocês podem acreditar
Não serão o derradeiro.
Em Pastos Bons por exemplo
Na semana retrasada
Se alguém fosse almoçar
Na casa de um camarada
Antes de sentar na mesa
Perguntava com certeza:
Esse frango é da virada?
E por isso meus amigos
Um bom conselho lhe dou
Se você ficar sabendo
Que uma carreta virou
Fique quieto não vá
Pois você passar
O que Antônio José Passou.