CANTORIA DO REGRESSO




CANTORIA DO REGRESSO
Silva Filho


Um dia volto além serras
Depois de tanto progresso
Para firmar meu regresso
E rever a amada terra;
Vou ver se o gado inda berra
Se ainda cai o orvalho
Se o sabiá vem ao galho
Se ouço o som do repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.


Quero ouvir a vizinhança
Gente humilde, hospitaleira
Um açude pelas beiras
O povo entregue a festanças;
O peão que o boi amansa
Nos botequins, o baralho
Ao longe um forte chocalho
E o mesmo tom do repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.

Quero que a mesma Capela
Inda toque o mesmo sino
Brincadeiras de menino
E as mocinhas nas janelas;
O tropeiro numa sela
Os plantadores de alho
E na roça o mesmo esgalho
Aquela voz do repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.

Os passeios pela praça
O namoro às escondidas
A noiva pra ser pedida
E o noivo pela trapaça;
Um beiju de boa massa
Papai fazendo espantalho
Mamãe com o mesmo agasalho
E o vento com seu repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.

Quero ver u’a farinhada
Um engenho de açúcar
Quero matar u’a mutuca
Roubando sangue por nada;
Quero encontrar a boiada
Com o vaqueiro já grisalho
Vencendo qualquer ramalho
E um improviso fluente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.

As conversas dos idosos
Impondo o mesmo respeito
Os jovens mais satisfeitos
E também esperançosos;
Os mesmos raios formosos
Que o sol lança no cascalho
Bandeirolas de retalho
Anunciando um repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.


Quero chorar de alegria
Quero abraçar meus amigos
Quero que o melhor artigo
Seja a mesma serventia;
Quero percorrer as vias
Onde fiz meus atrapalhos
E a troca dos cabeçalhos
Que só lembravam repente
Não quero ver diferente
Nem caminho e nem atalho.