UMA ROSA NO ASFALTO

 
Zeca Pedro era vaqueiro
Um herói, lá no sertão.
Vivia sempre cercado
de paparico e atenção,
as moças lhe paqueravam
e os homens o admiravam
por ter um bom coração.

Rosinha moça formosa,
Filha única, mimada.
que também era querida
por ser meiga e educada,
líder na comunidade
desde sua tenra idade
ensinava a meninada.

E os dois cresceram juntos
ali no Sítio Lajeiro.
Primeiro amor de Rosinha
foi Zeca, o grande vaqueiro.
Mesmo sem ser tão bonito
para ela ele era um mito
e foi o seu amor primeiro.

Muito cedo se casaram,
tinha ela quinze anos.
Já ele com vinte e três,
estava cheio de planos.
Queria vencer na vida
para dar a sua querida
conforto sem desenganos.

Apesar de serem pobres,
viviam ali muito bem.
Ele na lida de gado,
ela ajudando também,
por serem bem controlados
juntavam alguns trocados
o que a um pobre convém.

Zeca era respeitado
na região que morava.
Eram muitos fazendeiros
que a ele contratava,
e além das vaquejadas
onde havia umas “boladas”
o Zeca sempre levava.

Rosinha era uma ativista
na sua comunidade.
Ajudava sempre a igreja
por amor e caridade,
só ganhava algum dinheiro
de um bom rico fazendeiro
por ter a escolaridade.

Ainda não tinham filhos,
decisão bem planejada.
Queriam juntar um pouco,
ter a vida organizada
para que os seus rebentos
muito além dos alimentos
tivessem vida ajustada.

E assim sobreviviam
nessa tão simples rotina
até que uma grande seca
lhes trouxe uma nova sina
no ano de oitenta de dois,
uns quatro anos depois,
de ter casado a menina.

Foram os dias mais difíceis
que todos ali passaram.
todo o gado morreu,
e os legumes secaram.
Serviço já não existia,
e o que Zeca mais fazia
fazendeiros não pagavam.

E o mais Rico fazendeiro
que pagava a Rosinha
pra ensinar os meninos,
mais interesse não tinha
da  obra continuar,
não podia mais pagar
como antes ele vinha.

O pouco que eles juntaram
começaram a vender.
Doía no coração
mas não tinha o que fazer.
Rosinha muito abalada,
porém não dizia nada
pra Zeca não perceber.

Venderam logo os Móveis
numa feira da cidade.
por um preço muito baixo
coisa de oportunidade.
Um conhecido soldado
que era bem remunerado
comprou tudo, sem maldade.

Um pedacinho de terra
Zeca teve que vender.
O quintal da sua casa
ele via se encolher.
Acabou-se o pomar,
onde ele iria plantar
quando voltasse a chover

Tudo isso ia tirando
de Zeca a alegria.
Rosinha lhe dava forças,
mas quase não a servia,
já vivia pensativo
pois não tinha mais motivo
de viver essa agonia.

Começou a planejar
dali a sua partida.
Não queria pra Rosinha
mais aquela triste vida.
Iria tentar a sorte
em terras longe do norte,
deu início a despedida.

Foi duro vender a casa
que eles mesmos fizeram
era como destruir
o que eles mais quiseram.
Mas não tinham opção
mesmo contra o coração
por pouco dinheiro deram.

Mais difícil foi ainda
vender o seu alazão,
seu companheiro de lutas
nas festas de apartação.
Zeca fechou-se em pranto,
e os dois choraram tanto...
foi de cortar o coração.

Numa viagem insegura
foram Zeca e Rosinha,
rumo ao desconhecido
saíram de manhazinha
ainda com o dia escuro
disse Zeca: Ah! Eu juro
que volto à minha terrinha.

Por terras muito estranhas
por alguns dias rodaram.
Se olhavam em silêncio,
muito pouco se falaram.
Pensavam o que seria
que a sorte lhes traria?
pensando nisso chegaram.

A primeira impressão
que tiveram da cidade
foi de que eram pequenos
devido a imensidade.
Se sentiram tão perdidos,
de certa forma oprimidos
naquela nova verdade.

Sem ser mais sensação,
sem ser mais admirado,
Zeca sentiu grande choque
se sentindo hostilizado.
Sentiu a falta do estudo,
lhe zombavam ali por tudo,
então  ficava calado.

O emprego que arrumou
foi de um simples servente
numa grande construção,
uma coisa bem diferente
daquilo que ele fazia
quando no norte vivia
como um vaqueiro valente.

Ali não havia o respeito,
ninguém o elogiava.
Não existiam troféus
e muito pouco ganhava,
mas derramava o suor
e para dar o seu melhor
Zeca sempre se esforçava.

Rosinha por ter estudo
não precisou de favor.
Foi logo ser assistente
no escritório de um doutor.
Um bom salário ganhava,
do que era bom desfrutava
sem preconceito ou terror.

Para fazer treinamentos
ela sempre
 era chamada
e sempre se destacando
por ser a mais aplicada,
por isso foi promovida
e foi mudando de vida,
deixou de ser acanhada.

Já o Zeca continuava
num sofrimento horrendo.
Saia de madrugada
e só comia correndo.
Não tinha tempo pra nada
sentia que a sua amada
estava lhe esquecendo.

Rosinha não era a mesma
estava mais vaidosa.
Entrou n’uma academia
pra ficar mais formosa,
na empresa era querida
e por todos conhecida,
lá chamavam-na de Rosa.

A Rosinha reclamava
por Zeca não se arrumar.
Falava do escritório
como se fosse o seu lar.
Dizia que lá que era bom,
Tinha TV, tinha um som,
e o povo sabia falar.

Num dia negro e cruel
Zeca assistiu o seu final
Rosinha beijando um homem
num carro em sinal.
Ali perdeu o seu chão
sentindo no coração
ser encravado um punhal.

A grande seca tirana
dos braços dele tirou,
o seu amor, sua vida,
só a honra lhe restou.
e sem esperar mais nada
pôs-se de volta à estrada,
Rosa no asfalto ficou.

 
                     *O acróstico a seguir é uma interação do poeta Damião Metamorfose, a quem agradeço.
 
Da cidade se ausentou
A vida foi transformada
Mas ao voltar pro Sertão
Impôs uma nova jornada.
Servindo em muitas fazendas
Impressionando outras prendas
O herói da vaquejada!
 
Fim.



Damísio Mangueira
Enviado por Damísio Mangueira em 16/03/2013
Reeditado em 18/03/2013
Código do texto: T4192560
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