Juca das Flô e o bode

Quem nessas Minas morou,

numa cidade pequena,

que não guarde igual fulô

uma lembrança amena

ou um conto pitoresco

um cadinho de ar fresco

daquelas tardes serena?

Era Rita Fortunata

mulher d'home brigadô.

um contador de bravata

da Bíblia duvidadô

não acreditava em nada

não fosse coisa provada.

Seu nome: Juca das Flô.

Era tão arriminado

o tal home brigadô

que o povo do Cercado

lhe tinha grande temor,

em qualquer rusga de peso

não há quem saísse ileso

que não lhe devesso favor.

Mas aquela a quem um dia

seu carinho prometeu

é quem jogava água fria

no terrível gênio seu.

Falava pro insolente:

_ Lá fora seje valente.

Cá em casa mando eu.

Era só quem neste mundo

dominava aquela fera.

Era um rasgo profundo,

tenaz que nunca libera.

Que na alma do matuto

mostrava um sistema bruto

com ares de primavera.

Naquela pobre casinha

ali nas grimpa da serra,

final de rua que tinha

feitio de estrada de terra,

morava o gentil casal

feito um ninho de trocal

Onde a ternura se encerra.

Mas naquelas redondeza

morava Zeca Firmino,

um bicho na natureza,

o criador de caprino.

Sujeito rude e tacanho,

ele tinha em seu rebanho

bode grande e pequenino.

Também naquelas paragem

tinha um home de visão,

chamado Joaquim da Vargem

cheio de boa intenção.

Começou a erguer um prédio,

sobrado de porte médio

com parecença de mansão.

Morando o tal Juca das Flô

ao lado da construção,

achava de dar valor

no seu pobre barração.

Dizia pra Fortunata:

_Vivenda de magnata.

Esse vizinho é dos bão!

Mas com o recurso minguado

o tal de Joaquim da Vargem

foi deixando abandonado

seu projeto em desvantagem

e os cabritos do Firmino,

como nos alpes andinos

fez do prédio estalagem.

A madrinha do rebanho

não era uma cabra não,

era um bode preto, estranho

com jeito de assombração,

que subia as escada,

se instalava na sacada

do edifício em construção.

Joaquim da Vargem nervoso

co'a ousadia dos cabrito

subia a escada ruidoso

escaramuçava aos grito

o rebanho do Firmino:

_ Inda enforco esse mofino

quando eu topá com o mardito.

Numa dessas, Fortunata

com o seu home Juca das Flô

descançava na mamata,

era tarde de calor.

Acossado, o bode preto

saltando meio cambeto

do sobrado então pulou.

Direto sobre o delhado

do casal lá foi o bode,

varou telhas e ripado,

já dentro fez um pagode.

Investiu na Fortunata,

pisou no rabo da gata,

no Juca deu um sacode.

Levantou-se em duas pata,

deu um coice nas gamela,

saltou derrubando as lata,

deu marradas na costela

do bravo Juca das Flô.

Nem a ele respeitou!

saiu quebrando a janela

Depois do causo passado

Juca das Flô se benzeu.

rezou o credo arrepiado,

lembrando o que aconteceu.

Cismou que fosse o capeta

chifrudo de barba preta

que em seu telhado desceu.

Carlinhos Colé
Enviado por Carlinhos Colé em 03/11/2011
Código do texto: T3315416
Classificação de conteúdo: seguro